FETEAG - É a gente ir de encontro ao mar

por Taciana Oliveira
Colaboração: João Gomes___


Fábio Pascoal/Divulgação
A trajetória de Fábio Pascoal se conecta com a fundação do TEA – Teatro Experimental de Arte – e ganha alicerce na criação do FETEAG – Festival de Teatro do Agreste. Fábio é antes de tudo um apaixonado pela dramaturgia, uma figura que respira teatro e verbaliza essa paixão na produção de um dos mais importantes festivais independentes do Estado. O depoimento abaixo são trechos de uma conversa que tivemos, onde Fábio partilha de suas histórias e afetos, que são responsáveis por uma rica contribuição na construção de uma cena teatral no agreste de Pernambuco. Conhecer Fábio, naquela tarde do mês de janeiro, foi como um convite para mergulhar no sentido literal das palavras devoção e empenho. Ah! Fiquem atentos para a próxima edição do FETEAG que acontece no segundo semestre!


TEA/Divulgação


Somos contemporâneos

Sou filho de Argemiro Pascoal e Arary Marrocos. Eles foram fundadores do Teatro Experimental de Arte. Meu pai já fazia teatro antes, no Teatro de Amadores de Caruaru, um grupo que já estava estabelecido na cidade. Um teatro bem convencional para época deles. Então, em 1960 eles participaram de um festival estudantil. Eles frequentaram o festival e ficaram entusiasmados com toda a produção, com tudo que vinha de fora, de outros estados. Isso deu um ânimo para se juntarem com os amigos e criarem o TEA em 1962. Eu e o TEA somos contemporâneos, porque eu nasci em fevereiro de 1962 e o TEA em junho. Nascemos praticamente juntos. Então minha vida toda teve muito convívio com o teatro, não só com o teatro mas com os artistas de um modo geral, com poetas, com pintores, com artistas gráfico, músicos. Minha vida toda esteve muito atrelada a essa cultura. Então aos 15/16 anos eu sempre fiquei nas coxias dos grupos, sempre trabalhando nas partes técnica, sempre fiz essa ação no TEA.

O TEA

Divulgação
É o segundo grupo mais antigo em atividade no território do Brasil. Ele é Patrimônio Vivo do Estado e Ponto de Cultura. A sede do TEA é o Teatro Lício Neves, nome de um poeta de Caruaru. Na realidade, ele nasceu em Belo Jardim, mas morava em Caruaru. Um poeta que conviveu muito conosco, com meus pais. Vivemos muito juntos, e quando o TEA foi criado, na casa dos meus pais tinha uma garagem. E essa garagem foi transformada num teatro, que eles nomearam como Lício Neves. Uma homenagem a Lício.

Divulgação
A Sede do TEA

O TEA tem um teatro pequeno. Um palco de 5X3 metros e um auditório de mais ou menos 50 pessoas, feito em casa, numa comunicação com a casa e essa coisa toda. E eu sempre brincava com meu pai, e eu dizia vamos transformar isso em outra coisa e tal. Porque a gente tinha uma dificuldade muito grande, tinha um palco muito pequeno, e se usava muito espaço para oficinas. O palco era muito pequeno, não se conseguia colocar ali nem dez pessoas trabalhando. E a ideia era que a gente conseguisse nivelar o piso, deixar um espaço maior, de uma outra maneira transformasse aquele espaço. E fosse um espaço multifuncional, um teatro multiconfiguracional, como um jogo de armar, como o Teatro Hermilo e o Marco Camarotti. A gente queria muito isso. Em 2016, um temporal em Caruaru danificou uma parte da estrutura do teatro. Comecei a reformar e derrubamos o teatro, e reconstruímos. Estamos agora na fase fina,  precisando realmente de apoio. Ele terá um espaço de 20X8, que é mais ou menos o tamanho do Teatro Hermilo, uma arquibancada móvel, um mezanino e um escritório. Temos uma área total de 180 metros, levantamos a estrutura e agora falta só o acabamento. Buscamos parcerias, vamos tentando construir. Fizemos uma vaquinha e não conseguimos nada, mas algumas pessoas na cidade ajudaram de alguma forma. E assim a gente levantou e cobriu, e estamos agora na fase final, pensando em uma parceria com a Secretaria da Educação para levar alunos para assistirem aula de teatro. A contrapartida seria finalizar a reforma do teatro. 

Reforma do TEA/Divulgação


Um Festival Independente

Mas ou menos em 1980/81, junto com um amigo, Chico Neto, irmão de Cláudio Assis... A gente era muito amigo, eu e Chico. Fazíamos parte de um grupo de música. Eu escrevia as letras. E tinha também um amigo em comum nosso que colocava música. A banda chamava-se Olho D’água. Uma banda que fazia a gente trabalhar com músicas autorais. E com isso participamos de um festival bem importante chamado Festival Arizona de Música Sertaneja. E em 1981, eu e Chico, vendo a dificuldade que a gente tinha no TEA, em tratar as questões junto aos estudantes, criamos o FETEAG em 1981. Desde essa época é um Festival Independente, sempre! E durante muito tempo ele foi dedicado ao público estudantil, com oficinas, palestras, e a participação afetiva dos estudantes. Nos anos 90 esse Festival alterou um pouco o perfil e passou a ser de Teatro Estudantil e Amador do Agreste.

Festival Estudantil com abrangência estadual

Começamos a receber alguns grupos amadores da cidade, sempre em Caruaru. No final dos anos 90, quando foi lançado o Edital do Funcultura, o Festival abriu a grade para as escolas de todo o Estado. Passou a ser um Festival Estudantil com abrangência estadual. Nesse período de 1984, eu termino a Faculdade e venho morar em Recife. Fico de 1984, mais ou menos, até os anos 2000, indo para Caruaru acompanhar o Festival, mas não ativamente. Meus pais é que tocaram o Festival nesse período. No ano 2000, eu voltei, e a gente reconstruiu o Festival de alguma maneira.

A Mostra Profissional

Em 2004 lançamos a mostra profissional. Sempre existiam grupos profissionais que vinham pra Caruaru. Mas a partir de 2004, nós estabelecemos uma mostra independente, uma mostra profissional. O primeiro o espetáculo foi o “Espiral brinquedo meu” de Helder Vasconcelos. Então, é o primeiro grupo que abre essa nova fase do Festival que é a mostra profissional. A gente começa a entrar em contato com outros grupos. Em 2005 conseguimos trazer o Lume, um grupo de Campinas, uma referência no termo de formação do ator. O Lume vem com o espetáculo “Cravo, Lírio e Rosa”. Foi a primeira passagem do Lume pelo Nordeste.


FETEAG /2017 - François Moise Bamba no Boi Tita Teima  

A profissionalização e a Mostra Internacional

Nós trouxemos também um grupo de alunos da USP. Em Caruaru temos um casarão onde funciona a Academia Caruaruense de Cultura Ciências e Letras. Então à a meia-noite o casarão era aberto para a apresentação do espetáculo desse grupo. Eles ficaram uma semana conosco. Esse grupo hoje é a Companhia Hiato. Ali era o primeiro movimento da companhia, ela se formando enquanto grupo. É tanto, que em 2013, trouxemos eles de volta para mostrar exatamente essa trajetória, para as pessoas entenderem que é possível ser profissional. O que a gente provoca com a mostra profissional é uma onda de estímulo. Já que às vezes o teatro em Caruaru é tratado como um hobby. Eu percebia que os artistas não tinham uma necessidade como profissional, era mais um hobby que eles faziam. É a partir da mostra profissional que começamos a investir numa coisa muito mais formativa e profissionalizante. É a partir dessa trajetória que convidamos grupos do Brasil inteiro, e em 2016 nasce a Mostra Internacional.

Carta ao Pai no Boi Tira Teima


A primeira fase seria a partir de 2004. Mas em 2016 é que transformamos o FETEAG em um Festival Internacional. E nesse ano de 2016, vieram Yael Karavan, israelense que mora na Inglaterra, e Bruno Humberto, um português que veio pra cá e deu uma oficina e apresentou um espetáculo. Teve um outro desdobramento da Mostra Profissional. Na sequência culminou com a vinda do festival para Recife. A gente já tinha namorado um pouco isso. Em 2013 fizemos uma parceria com o Magiluth, que era o TREMA, e construímos uma grade juntos, Trema! - Festival de Teatro de Grupo do Recife e Feteag - Festival de Teatro do Agreste. Trocamos algumas coisas, por exemplo do grupo Hiato, um espetáculo de ficção que ia pra Caruaru a gente conseguiu através do TREMA, trazê-lo pra Recife, com o Espanta que vinha pra Recife, e nós conseguimos levar pra Caruru. Então em 2013 se fez essa parceria, mas a gente já tinha namorado essa parceria em 2008, com o festival chamado Conexão Cavalo Marinho idealizado por Helder Vasconcelos e Laura Tamiana. Eles fizeram esse festival, que acontece em Condado, na Zona da Mata, e também conseguimos fazer uma troca com eles. Levamos os espetáculos para Caruaru juntos, pela primeira vez. Como a proposta do Conexão era trabalhar em cima do trabalho do ator, a partir do Cavalo Marinho, e levar espetáculos que tivessem como base o trabalho do ator. Levamos para Caruaru “Brincadeira de Mulato” de Maria Paula, que também estava compondo a grade do Conexão. E em 2013 a gente fez essa parceria com o TREMA, que a gente conseguiu levar para Caruaru o Espanta e trazer pra cá o Café com Queijo do Lume.

Mostra Descentralizada

Mostra Descentralizada

Criamos uma outra mostra, chamada Mostra Descentralizada que acontece na Zona Rural. O primeiro espetáculo que a gente levou foi Olhos de café quente de Quiercles Santana com Soraya Silva no elenco, que mora na Itália. Fechamos um contrato e ela fez um dia no palco oficial, no SESC, que é a nossa sede em Caruaru. E ainda nas zonas descentralizadas da periferia, na Zona Rural mesmo, não é na periferia, é nos sítios. Em 2017 e em 2018 a gente faz novamente a Mostra Descentralizada, agora com a produção do próprio TEA, um espetáculo chamado Jogos na hora da sesta que discute a violência estudantil na escola. Em 2019 a gente já tem um grande convidado: os 15 anos do Espiral brinquedo meu, de Helder Vasconcelos. E vamos fazer na Zona Rural. Estamos procurando uma grande festa pra apresentar o espetáculo. O Helder tem uma kombi que chama-se Zuzu. Vamos apresentar filme e o espetáculo. A gente sempre ocupa esse espaço na cidade, tem um ponto fixo em Caruaru, que usamos muito, que é a Casa de Lúcio do Alto do Moura. Lúcio Omena é um médico caruaruense que foi secretário presidente da Fundação de Cultura, e a gente todo ano faz alguma coisa na casa dele. 

Guandú na casa de Lúcio
Mostra Profissional em Recife

A partir de 2016 a gente realmente resolveu dar a cara tapa e assumir e fazer uma Mostra Profissional em Recife, uma janela na realidade. Essa janela tem uma intenção bem objetiva, que é dar visibilidade à produção, já que é muito difícil a gente trazer esse olhar da imprensa pro interior. Então nós criamos essa janela exatamente pra possibilitar essa abertura na mídia, e eu acho que supriu um efeito fantástico assim, na cobertura que se começou a dar. E aí em 2007 a gente fez parceria com outros dois grupos e festivais: um no Rio de Janeiro e outro na Bahia . E aí, a partir disso, a gente consegue trazer obras importantes. A gente aposta sempre no FUNCULTURA, e nunca teve de fato um apoio da prefeitura, só a partir de 2017. A gente sonha e vai. Tem uma passagem num livro chamado Alma imoral, de Nilton Bonder, que diz o seguinte: O mar não se abriu para Moisés passar, Moisés se atreveu e o mar se abriu. Eu penso sempre nisso, nesse atrevimento de você entrar e as coisas acontecem, não esperar que ele abra, é a gente ir de encontro ao mar.
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Para saber mais sobre o TEA, assista os documentários abaixo:





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Taciana Oliveira é mãe de JP, cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem