por Rebeca Gadelha__
Lâmpada
Diurna — Narrativas
Circulares (Editora
Penalux, 2020), é
um livro de contos do escritor e tradutor Lucas Daniel Tomáz de
Aquino. As histórias surpreendem por seu estilo e narrativa: os
textos são como peças de um quebra-cabeça embaralhadas ao qual o
leitor vai montando devagar, sendo preciso, as vezes, voltar para
determinado texto a fim de melhor entender o outro; de forma que, se
puder fazer uma recomendação, aconselho que o livro seja lido duas
vezes, onde, na segunda, juntar-se-iam os fragmentos da
escrita
como peças, a fim de formar outras imagens e perspectivas. De fato,
neste aspecto a habilidade de Lucas Daniel na composição e
organização dos textos é digna de nota: suas histórias, que
trazem
elementos que lembram HQs como Sandman, atiçam a curiosidade do
leitor sobre os rumos que tomará, de forma que mesmo quando queremos
desviar os olhos, permanecemos presos ao enredo.
Em
Lâmpada,
morte e violência são fios
condutores
e tópicos
da cruel banalidade,
violência esta que aparece de várias formas, seja por
abuso psicológico (A Pessoa em
Questão)
ou no
quesito gráfico
(Decurso Aleatório
e Do Relativismo Ético ao
Deleite Assassino como Obra Prima)
num estilo a Tarantino, ou ainda semelhante ao do gore
ou
gory, subgênero
que se caracteriza pela presença de sequências
violentas, sendo sangue, mutilação, desmembramentos e tortura algo
bastante
comum
nas suas narrativas.
O subgênero é popular em animes (Bersek, Hellsing, Attack on Titan,
Blood C, só para citar alguns exemplos) e games (Resident Evil, God
of War, Mortal Kombat, Doom, etc). Embora um dos objetivos do gore
possa ser causar desconforto ao leitor ou expectador, nem sempre é
fácil definir sua função na história.
A violência é sim um elemento abundante em Lâmpada, porém, em um
primeiro momento, questionei a mim mesma sobre qual a
intencionalidade da mesma, lembrando assim de uma das minhas novels
favoritas e da entrevista com seu autor, Gen Uroboshi. O
ponto
é que, em uma de suas entrevistas, Uroboshi é questionado sobre o
uso de violência por dois de seus personagens - que, na obra citada
são ambos assassinos em série - ao passo que Gen declara que a
violência se tornou uma forma de entretenimento e que nós,
expectadores, somos coniventes com isso: o que queremos é o
espetáculo, puramente. Em Narrativas
Circulares,
diferentemente das obras que citei como exemplos de gore, não há um
herói ou um vilão, sequer há um inimigo a ser derrotado, o que
encontramos são pessoas: pessoas que poderiam ser nossos conhecidos
ou parentes que são capazes de atos que podemos chamar de horríveis
- como a mulher que atirou nos joelhos do primo do marido e o amarrou
à via férrea, ou o homem que rasga a jugular do cobrador ao subir
no ônibus e que mata pessoas enquanto disserta sobre a filosofia da
vida e da morte. São situações que poderiam aparecer facilmente em
programas como Cidade 190 ou Brasil Urgente e que nos levam a
refletir sobre o indivíduo na sociedade, sobre os rumos abruptos da
vida e sobre nós mesmos: que atos horríveis podemos cometer se
tivermos a chance e porquê?
Livro:
Lâmpada diurna
Editora:
Penalux
Páginas:
128
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Lucas
Daniel Tomáz de Aquino nasceu em Brasília em 1986 e é escritor
e tradutor, tendo vertido ao português textos de Leopoldo Alas
Clarín e Juan Manuel Ortí y Lara. Publicou textos, entre prosa e
não ficção, em veículos como Gazeta
do Povo, UOL, Cosac Naify, Revista HouseMag, São Paulo Review,
dentre outros. Em 2019, lançou "Meia-noite em Nápoles"
pela Coleção Narrativas Curtas (Editorial Testamento
Geométrico). Atualmente conclui a escrita de um romance e a
produção de uma graphic novel.
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Rebeca
Gadelha nasceu no Rio em agosto de 1992, cresceu em Fortaleza, na
companhia dos avós. Geógrafa sem senso de direção, artista
digital, é apaixonada por animes, mangás, games e chá gelado. Tem
medo de avião e a única coisa que consegue odiar de verdade é
fígado. Foi responsável pela diagramação, ilustrações e
concepção visual em Manifesto Balbúrdia Poética: 80 tiros (CJA
Editora), Coordenação, Designer e ilustrações em Laudelinas
(Editora Nada Estúdio Criativo), participa da coletânea Paginário,
publicada pela Editora Aliás. Atualmente escreve para as revistas do
Medium Ensaios sobre a Loucura e Fale com Elas sob o
pseudônimo de Jade.