Por Mariana Galhardo/Divulgação__
Desumanizados: a condição humana posta em xeque
A provocação em forma de romance-ficção ensaística
Na atual conjuntura, o ser humano se vê cercado por todos os lados: crise pandêmica, quarentena, crise econômica e, por último —, mas não menos angustiante —, o homem agora se vê (ainda mais) em crise existencial. E é nesse contexto de conflitos internos e externos, que Nélio Silzantov lança seu primeiro romance, intitulado Desumanizados.
A obra do autor, mestre em Filosofia e em Estudos da Literatura, tem como tema central o ser humano e as questões pertinentes ao seu lugar no mundo, bem como sua identidade e à morte. Outros pontos abordados, e que têm influência sobre a condição humana, são: a influência das tecnologias na contemporaneidade, a importância de se conectar com outras pessoas e o lado sombrio da mente humana. Todas as instigantes reflexões propostas por Nélio em sua narrativa introduz o leitor, de maneira muito sutil e elegante, às correntes filosóficas como as de Sartre, Heidegger e Schopenhauer.
A presente publicação é um romance, quase um ensaio e um flerte com a ficção, que arrasta o leitor para a trama de coincidências, que coloca personagens – desconhecidos entre si – em situações-limite da vida: caminhos que os levam para a morte ou para o lado dela. Por ser seu caráter híbrido, entre ensaio e ficção, o autor faz uso das características dos dois gêneros, fazendo questionamentos e expondo situações que expõem os medos e os males da sociedade (racismo, misoginia, homofobia, entre outros) sem oferecer respostas fáceis. Na verdade, as principais intenções artísticas de Desumanizados são estabelecer um diálogo entre o autor e a sociedade e gerar incômodo, inquietação.
Esse passeio pelos lados obscuros natureza humana, pela homofonia do cotidiano e pela mortalidade cadenciada expostas gera no leitor a sensação de ser um constituinte da história e de estar em suspensão, estando, ao mesmo tempo, ressentido e curioso sobre as vidas que ali se acabam.
Mistura entre realidade e ficção
Nas palavras de Jorge Vicente Valetim (Letras – UFScar), professor que assina a orelha do livro, Desumanizados é um misto de ensaio, ficção e narrativa breve. O escritor deixa pistas e referências a correntes filosóficas, como as de Sartre, Heidegger e Schopenhauer, “e de escritores alinhados numa postura de reflexão sistemática sobre o homem e o seu ser e estar no mundo, como são os casos de Clarice Lispector, José Saramago e Vergílio Ferreira”. O autor da apresentação continua: “Vindo à lume em tempos de isolamento social, pandemia, medo de circulação pelos espaços da cidade e exposição exacerbada nas redes sociais (marcadas, muitas vezes, por discursos intolerantes e desumanizadores), Desumanizados é exatamente uma obra de convite à reflexão, ora para nos fazer perceber o quanto nos afastamos daquilo que nos distingue (a nossa própria humanidade), ora para nos incitar a uma autognose necessária a fim de entender o que fazemos com o tempo e o espaço em que nos foi dado viver. Sem querer roubar o prazer da leitura, deixo o convite para cada um, como o do protagonista, encontrar o seu Van Gogh e com ele criar uma rede de diálogo, compreensão e respeito, não apenas como sinal de aproximação com os outros, mas, sobretudo, como indicativo de um cuidado consigo mesmo.”
Para Nélio, o livro trata do paradoxo que é o homem. “Um ser capaz de realizar coisas sublimes e monstruosas”, relata o escritor. “Ele fala também da finitude da vida e de como as pessoas se relacionam, mas também fala da solidão. Há muita violência nessa e, em boa medida, companheirismo. Busquei expor com a minha história a fragilidade do espírito humano e ao mesmo tempo o seu potencial opressor, capaz de desumanizar o outro”, finaliza.
Um trecho:
“Entre o apagar das luzes e o embalar do sono dividindo a mesma cama, Dolores recordou-se de quando cruzaram os olhares pela primeira vez. Naquela época, ambas estudavam no Colégio Estadual Rafael Spínola Neto, pela manhã, e à tarde frequentavam os cursos de habilidades manuais e profissionalizantes do Orfanato Lar Santa Catarina de Sena. Dolores atravessava a pior fase da sua existência. Sabia que não era a única a se revoltar contra Deus e os homens, pela vida que ela e as demais garotas da sua idade tinham. Era inadmissível que, em pleno século XXI, mesmo diante de toda evolução humana — racional, tecnológica, econômica e cultural —, inúmeras crianças e adolescentes permaneciam fadadas a experimentar as situações mais desumanas que um indivíduo poderia suportar”.
Serviços:
Desumanizados, romance (188 p., 42 reais). Nélio Silzantov ‒ Editora Penalux.
Disponível em:
https://www.editorapenalux.com.br/loja/desumanizados