Três poemas e um curta-metragem

por Taciana Oliveira___




Um quadro que cai de repente

Um susto, meu alimento no chão

O tecer de uma memória imprópria

O ocaso dessa casa me invertendo a pele

E cuspindo no meu sangue as suas frestas

As frestas de ventos e cheiros (compotas, luzes, exiladas) 

a palmatória da morte chegando...

Todos os prenúncios de uma realidade funesta

Me umedecendo as mãos de um suor adolescente,

Que trilhados na rispidez das tuas nádegas

Me borra a alma de um gozo renascente.

Era preciso renascer nesse ânus sagrado,

Brindar com esse sangue anêmico,

O sangue de Cristo meu esperma.

Esse charco branco, esse visgo primórdio de um tempo breve

As paredes conclusas e indissolúveis.

Um espaço de memórias que se compõem, se 

guardam e se perdem na lâmina necessária do tempo.

Onde a surdez dos dias permeia, ainda que distante,]

O infiltro de um húmus nessa terra opaca.

Uma terra nervosa irrigada de dúvidas.


Intervalo, poema de Zeca Barros






Nem procurei palavras certas, nem rimei hipocrisias com verdades,

e era só a falta de humanidade que me abalava,

era só o sorriso cansado que me redimia.

Como um cão lambendo as feridas,

esperando o afago, procurando ser lembrado.

A vida escorria em copos de cerveja,

em um último cigarro, em um esboço para uma melodia.


E agora me falta o abraço

Sinto fome, fome de uma puta velha,

fome dos valores normais da minha adolescência.

As cores da verdade me assustam.

O corpo cansado não me fortalece.


Saudade de uma amizade tardia,

de um vento com cheiro de maresia

sufocando minhas narinas.


Quando a tempestade chegar, brotará nos canteiros o esterco,

sombra de uma vida sem perfume, apenas esboço de mal me quer.

Como é inútil semear poesia, em morte se consome o vazio


Eu apenas quero uma canção que me leve de volta a minha morada.

E por falar em Deus, a que horas chegará a vida?



O dia que cantei para a morte, Taciana Oliveira




A minha ira é o verso do meu amor“

Clarice Lispector





Ó Ceará dos meus bordéis

Ainda vingam suas paixões

Em braços alheios.

Ó Das-dores minha pequena puta

Sem sombras e medos,

Tão magra,

me abraça!


Nem magra

Nem mente

Nem morta

Nem nada


Ela passou (riu)

Me lambeu de morte

E eu nem me vinguei.


Das Dores, Eduardo Cordeiro




*Para Lilian, Zé Mário, Danilo, Araújo e Eduardo 

**Das dores (2006), direção de Taciana Oliveira




Taciana Oliveira é mãe de JP, comunicóloga, cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.