por Taciana
Oliveira__
Morar no centro do Recife, durante um bom tempo, foi a minha salvação. Minha história com o bairro da Boa Vista começa em fevereiro de 1989. No primeiro semestre, eu era “devolvida” ao meu pai. E assim depois de um hiato de quase 13 anos recomeçava minha trajetória em um edifício localizado na Rua Sebastião Lins, tendo como vizinho o cinema São Luiz e o Rio Capibaribe. É neste território que abracei os melhores amigos, li os melhores livros, bebi os piores vinhos (inesquecíveis ressacas).
No pouco tempo que habitei aquele espaço, ele jamais saiu de mim. Sou a
Taciana do 12º andar, a insone que caminhava sobre as pontes nas madrugadas do
Recife, a rebelde que vivia enfurnada entre as milhares de estantes e
prateleiras da Livro 7. Sim, aquele paraíso também era meu e nele ganhei folêgo
para resistir aos momentos inexplicáveis da minha adolescência e início da vida
adulta.
A
história da Livro 7 coincide em parte com a minha identidade, minha formação de
caráter, meu "foda-se" para um padrão de comportamento infeliz. Quantas vezes fugi
de casa para adentrar naquele enorme galpão e comprar um livro, ou simplesmente
conversar com um amigo. A livraria era o playground da cena cultural da cidade,
o confessionário, o ponto de encontro para a insurreição poética e as
aspirações democráticas.
Nesta
semana perdemos Tarcísio Pereira, o homem que desenhou esse cenário e abrigou gerações
em corredores e “labirintos” abençoados por grandes nomes da literatura, artes plásticas, filosofia e música. Quando soube da sua partida, lembrei que nunca
fomos apresentados em todos esses anos. Nossos olhares sempre se cruzaram no
tanto de vezes que frequentei a sua livraria, ou nos eventos culturais que
frequentamos. Existia um silêncio respeitoso que se manifestava em nossos
sorrisos.
Este
texto chora não apenas a morte de um homem que vendia livros, mas pelo caos que
alimenta a ignorância e destrói o futuro de tantas famílias. Este ano não
haverá carnaval. A morte nos assombra sem pedir licença. Nada nos conforta.
Tarcísio,
perdoe, mas apenas hoje tomo coragem e escrevo, afinal você mora em nossa memória afetiva. E assim, sigo pelas ruas que você caminhou e me despeço com o trecho do poema Os Ombros Suportam o Mundo, de Carlos
Drummond de Andrade:
Chegou
um tempo em que não adianta morrer.
Chegou
um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida
apenas, sem mistificação.
Taciana
Oliveira é mãe de JP, comunicóloga, cineasta, torcedora do Sport
Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e literatura.
Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser
ouvir: Ter bondade é ter coragem.