por Valdocir
Trevisan___
A correria do indivíduo do século XXI é
muito pesada e a tal tecnologia que deveria facilitar nossos caminhos, parece
não estar correspondendo. Ajuda em qual segmento? Não percebo as supostas
facilidades. Pelo menos na pandemia a tecnologia tem ocupado seu espaço com
maestria, mas esquecendo o Coronavírus (como se fosse possível), a internet e
as redes sociais não estão nos levando ao sonhado ócio criativo. A pressa não
diminui, e patrões e empregados correm para todos os lados dançando mediante
uma sociedade com ritmo alucinante. Incrível é constatar que a desgraça da
pandemia obrigou a diminuição dos passos da humanidade.
Que coisa dúbia. O avanço tecnológico não
permite segurança e nos leva ao descompasso do meu coração, como Alceu
Valença cantava, e enquanto isso vemos a tragédia da pandemia recuar nossos
horizontes.
Vamos devagar minha gente, pois se já tive
pressa... Pior são aqueles que correm como loucos e quando "chegam",
ficam pasmos querendo saber o que fazer. Tolos.
Não pararam para ver o pôr do sol e a dança
dos golfinhos. Depois, quando a ansiedade bate em suas portas, correm (de novo)
para psicólogos e psiquiatras. Tenho uma amiga psicóloga que disse no fim do
ano passado (fica tranquila, não vou dizer o nome, sigilo profissional), que
queria dois ouvidinhos novos no Natal.
Os Beatles já previam o fenômeno e sugeriram
uma semana com oito dias, na música "Eight Days a Week",
sessenta anos atrás.
Aí sim, tudo se resolveria. Será?
Duvido.
A velocidade de nosso tempo é, diríamos, trágica. Pessoas vivem no mês
seguinte, outros esperam o salário, outros nem sabem porquê falam que falta só
um mês para, para que, ninguém sabe, ninguém viu...
Ainda assim, sociólogos insistem no tal ócio
criativo. Como Michael Mafesolli, que disse que se o caos é impensável,
justamente por isso, deve ser pensado pois nossos cotidianos "formam um
verdadeiro princípio de realidade, e mais, da surrealidade".
Conforme ele, se tivermos a capacidade de
orientar o trágico, ao mesmo tempo, vamos andar de mãos dadas com práticas
sociais, com maior clareza. Caminhar com passos corretos em instantes imóveis,
para conseguir viver com mais harmonia, vivendo o tempo.
O tempo eterno, "imparável" coberto
de mistérios. A doutora em Comunicação e Semiótica da PUC-SP, Ana Maria Haddad
Baptista escreveu um artigo chamado "Tempos Suspensos", onde
disse que "Heidegger lembra que o relógio não é o tempo. Mede-o. Apenas
isso. Um mero indicador de que alguma coisa passa". Uma apreensão,
somente isso.
E se tem aqueles ávidos por trabalho, ansiosos
por natureza, existem aqueles que querem paz e amor. Querem sim, também oito
dias por semana, mas para amar. Como cantavam os Beatles: "oito dias
não serão suficientes para mostrar que eu me preocupo...eu amo você todos os
dias, garota...sempre em minha mente".
Sete dias numa semana é pouco para o amor. O
quarteto de Liverpool insiste no amor, "uma coisa que eu possa dizer
agora, eu amo você o tempo todo".
Não seria melhor parar e ver o pôr do sol? Não
seria melhor desvendar nossos mares e florestas?
E assim o tempo vai fluindo rápido ou
vagarosamente, você decide.
Para mim, o mar lembra meus anos passados,
presente e futuro.
Acompanho o mar desde 1962 quando minha mãe
me levava na praia de Tramandaí de fraldas. Foi um tempo muito feliz e por
certo tive várias semanas de oito dias.
Talvez essa seja a proposta do quarteto mais
famoso do mundo, um alento à harmonia e ao amor. Eight days a week. O
problema é que não iria demorar para surgir novas propostas com sugestões de
semanas de nove dias né, os ansiosos estão à espreita.
Eles não querem só caminhar, querem correr e
se puder voar, esses, esses, estressadinhos...
Voar não no sentido romântico, mas de
velocidade mesmo. É por isso que mudar para oito dias não vai resolver a
questão. A proposta é esticar o tempo para diminuir o "pique", e para
os românticos amarem mais e mais, abraçando todos amigos e amigas que estão
distantes.
Ou ainda quem sabe, propor o contrário, uma
semana de seis dias para diminuir ansiedades ou determinar o caos total. Não
sei se os Beatles aprovariam, acho que não. É que não podemos esquecer que
namoros e casamentos em seus primeiros momentos são lindos e coloridos, mas
quantos casais se separam? Para esses que só brigam, oito dias por semana pode
ser uma eternidade. Ah, nossas confusas relações humanas e seus conflitos.
Não é todo mundo que tem sua Yoko Ono.
Enquanto isso, vou escutar meu vinil dos gênios de Liverpool...
Valdocir Trevisan é gaúcho, gremista e jornalista. Escreve no blog Violências Culturais. Para acessar: clica aqui