por Valdocir Trevisan___
Banksy |
Muros são apenas muros, não é mesmo?
Será? O muro de Sartre é um "não muro", onde
condenados estão de frente para o pelotão e sonham em se esconder para se safar
da iminente morte.
Existem homens que querem tudo, querem conquistar o mundo. Não
serão simples muros que irão segurar essa turma. Não, eles podem até ceder terrenos,
mas os muros não irão impedi-los de seguirem suas jornadas ambiciosas. Ah, não
vão!
Para esses
representantes do progresso iluminista sempre haverá uma fenda, uma brecha e
não será um simples muro que irá destruir seus "direitos".
Direitos? Sei lá!
E os muros invisíveis? Sim, existem, e são muitos. Os
muros fantasmas, alguns carregamos há muitos anos.
Aqueles muros desgraçados, trancafiados no fundo da
alma, que Augusto Cury tanto combate e os manda para os quintos doa infernos.
Poderia ser pior ainda. Imagine se as pessoas fossem
invisíveis e não existisse apenas os muros.
Triste.
Pense nessas pessoas, enlouquecidas, mexendo em
mobílias ou furtando vinhos em adegas especiais. H.G. Wells descreve em seu homem
invisível outras invisibilidades. A principal a do menosprezo. Porém, seria
ótimo fica invisível diante de um pelotão de fuzilamento, não é mesmo?
Mas a questão permanece: um muro é, afinal, apenas um
muro?
Como todas as tempestades passam, nossa fé entra em
ação. Kierkeegard nos apresenta em Tremor e Temor (1843), o valor dela.
Temos que buscar doses de fé para avançar na vida. Basta lembrar a jornada
bíblica de Jó.
No famoso Diário de Anne Frank, alguns dias
antes de ser descoberta em seu esconderijo, a garota ainda não entendia seu
sofrimento.
Por que "marcaram" ela assim?
Quem definiu seu destino?
Quem foi responsável por tanta dor? E por quê?
Os muros de Anne desmoronaram.
Era tudo o que os condenados de Sartre desejavam,
muros desmoronando. Na hora derradeira, os miseráveis condenados sonhavam em
penetrar no muro da morte.
Mas os muros dos comandantes loucos são muito fortes, são
terríveis.
Sartre ameniza o sofrimento do seu personagem:
"esse negócio de morrer não é nada natural e como eu iria morrer mesmo,
nada mais parecia normal, nem o monte de carvão, nem a boca imunda de
Pedro". Aquele muro não tem sentido, era um muro crivado de balas,
vazio.
Mas o estranho é que para nossa segurança nos fechamos
em muros ao redor das nossas propriedades.
E aí sim, quanto mais alto e forte, melhor. A gente
reforma, pinta e admira esses muros, os muros da segurança. Suas cores são
perfeitas. Não há nenhuma relação com os muros do filósofo. Não tinha como existir
muros coloridos em 1939. Era um mundo anunciando a segunda grande guerra.
Tempos de guerra não permitem visões coloridas, muito menos liberdades. Os insanos
querem terras, muros e tudo.
Temos ainda os muros de Berlim, Trump, Camus e de
Tróia... O último resistiu nove anos em sua batalha contra os gregos.
E os muros do coração? Vocês conhecem? Quem faz Reiki e
outras terapias sabe do que falo.
São aqueles que insistem em aniquilar nossos corações,
bloqueando frestas do amor e da paz. As pragas mentais. No tratamento lutamos
com nossos muros individuais. Alguns enfrentam muros de 5m de espessura, outros
mais finos, outros mais altos. A luta é derrubar os obstáculos. Muros que
condenam mentes doentes às tristezas subterrâneas.
Recomendo, vale a pena. Meu muro quase não existe
mais.
Não seria melhor ser condenado à vida? Expressão
estranha, mas necessária. Quando entendemos que os muros espirituais são tão
funestos quanto os de tijolos, o caminho fica aberto, visível. Mesmo porque,
aflições fazem parte do cotidiano, sempre.
Para separações, surgem muros de todos os tipos, pois
existem homens de todos os tipos, as diferenças coexistem. A solidão pode estar
nos dois lados do muro e como o normal é não gostar da solidão, aquela que
devora, quero derrubar esses desgraçados. Que drama.
Não esqueçamos
que a solidão tem seus pontos turísticos, pontos para serem explorados.
Com muros ou não, isolando o mal, reavaliando nossas relações com o outro poderemos revelar onde erramos. Assim evitamos caminhos obtusos, pois como vimos a própria solidão tem lados opostos. O controle está em nossas mãos.
Quero unir, escutar outras vozes, refazer conceitos,
buscar corações sadios e plenos ou pelo menos, com espessuras insignificantes. Quero
distância dos muros assassinos, onde tijolos trabalham para o diabo. Quero
muros fraternos. Um muro, diríamos, com
alteridade, junto com total empatia com os outros, até daqueles que estão do
outro lado...do muro.
Valdocir Trevisan é gaúcho, gremista e jornalista. Escreve no blog Violências Culturais. Para acessar: clica aqui