por Marcela Güther/Divulgação__
Prefaciado
por Aline Bei, “O diálogo”, de Luizza Milczanowski, joga
com técnicas narrativas para falar sobre abuso e silenciamento
Obra
marca estreia potente da escritora carioca ao abordar, com linguagem
fragmentária e poética, a complexidade emocional de uma mulher diante de abusos
físicos e psicológicos. A autora foi contemplada em três gêneros em coletânea
do Prêmio Off Flip de Literatura 2021
“O
Diálogo” queima, arde, é o próprio inferno. E você precisa respirar. Precisa
respirar, mas a história está atrás do seu olho. Entenda, não se saí da
violência por uma porta. E o que seria apenas um homem que passa vira um
pesadelo absurdo. [...] A protagonista se apoia nas palavras que não disse, nas
perguntas que não fez. Uma espinha no queixo é a única testemunha, além de nós,
já que na praça todos estão cegos. Todos muito preocupados com a própria
existência – e eu me pergunto: onde estão os ossos da nossa protagonista?”
Aline
Bei,
no prefácio de “O Diálogo”
“O
diálogo se biparte em duas vias antagônicas: o silêncio de pedra, que sangra,
corrói o ser e o diálogo ultrajante, que, também a carcome por dentro, no seu
íntimo naufragado pelo desconhecido. Uma infância perdida em meio aos nós das
cordas aprisionantes do mundo adulto. [...] A escritora é bem jovem e já tem um
domínio inventivo das técnicas narrativas, com um amadurecimento incomum para
sua idade.”
Alexandra
Vieira de Almeida, doutora em Literatura Comparada pela UERJ
Uma
mulher que guardou, por muito tempo, a verdade dentro de si. Com a morte do seu
abusador, ela finalmente se sente livre para dizer, para romper o silêncio. A
morte é um espaço de reconstrução do quebra-cabeça de sua vida e do resgate de
sua voz. Presa nas garras do que entrelaça abuso e afeto, ela se vê diante da
dor de amar o algoz. A cura não é simples ou linear. O abuso finca feridas
sempre prontas para sangria.
Esse é
o mote do primeiro livro da escritora carioca Luizza Milczanowski, “O
Diálogo”, publicado pela editora Penalux. Ao longo de 160 páginas, a autora
percorre — em um monólogo escrito em terceira pessoa, focado em uma personagem
central, que não é nomeada —, o crescimento de um corpo de menina-mulher no mundo,
passando por questões centrais como silenciamento, abuso, morte, tempo e
memória.
Dividido
em cinco capítulos, “O Diálogo” é feito de dentro, do que é ser um
indivíduo no mundo, com suas contradições e complexidades, e dessa relação com
o meio social. “Um livro que faz, como a memória, um movimento, indo para
trás e para frente”, aponta a autora, que extravasa a narração padrão,
entrelaçando a voz condutora da história com a da personagem central,
oferecendo ao leitor uma visão ora interna, ora externa da mesma protagonista.
A obra
transpassa por outros assuntos fortes, como depressão, o alcoolismo, a
violência, o suicídio, a solidão, o existencialismo, a pobreza, e a autoestima.
“Esse conjunto de fatores, lembranças e sentimentos que nos tornam aquilo
que somos de maneira completa, complexa e contraditória. Foi um livro demorado,
que me exigiu muito emocionalmente. Demorei cerca de dois anos para
escrevê-lo”, informa Luizza. “São temas que me atravessam, que me incomodam,
que me perturbam, que me emocionam, que me doem, que me trazem muitos
questionamentos.”
A voz
da personagem de seu livro já existia há muitos anos na escrita de Luizza,
culminando na necessidade de escrever a sua história em todas as suas nuances.
“Eu comecei a perceber a presença dela em diferentes contos, narrativas curtas,
e de diferentes maneiras, em diferentes tempos e circunstâncias”, conta.
“Eu escrevi esse livro para dar voz à minha protagonista (dentro dela, vive
cada menina), para que ela pudesse contar a sua história – complexa e
contraditória - sem interrupções. Eu queria, mais do que isso, narrar o
silêncio, e a dor no silêncio.”
“O
Diálogo” é um desses livros que a gente lê de em um fôlego só, mas não
entende bem o porquê. Tudo já aconteceu, já é passado, apesar de afetar tanto o
presente da personagem. Lemos porque inicialmente queremos saber e, depois,
porque queremos entender. Somos guiados pelas aflições d’A Menina, pelas
memórias dela, por todas as reflexões sobre sua busca pelo que aprendemos a
chamar de amor”, analisa a escritora e crítica literária Thaís Campolina.
“O
livro é um misto entre o cerebral e o sensível, com perplexidades filosóficas,
mas também, suores, lágrimas e suspiros. Há toda uma poética da gestualidade e
de seus significados diversos”, analisa Alexandra Vieira de
Almeida, doutora em Literatura Comparada pela Universidade do Estado do Rio
de Janeiro (UERJ), que destaca o domínio inventivo das técnicas narrativas de
Luizza, com um amadurecimento incomum para sua idade.
Entre
Hilda Hilst, Vladimir Nabokov e Marguerite Duras
Tendo
como grandes referências Hilda Hilst, Vladimir Nabokov e Marguerite Duras,
Luizza afirma que escreve desde sempre. “Gosto de experimentar a linguagem,
de dançar e brincar com a palavra em diferentes formatos. Por isso digo que
simplesmente escrevo prosa e poesia. A escrita e a vida não se separam em mim.
Sou o que vivo e o que escrevo. A literatura é a forma que escolhi estar no
mundo.”
A
autora justifica suas principais influências literárias. “De forma
consciente, acredito que Hilda Hilst seja uma grande influência. Tudo nela
transborda e me fascina, inesgotável. Outra autora é Marguerite Duras, fundamental
para que eu me encontrasse na escrita que pode ser fragmentada, de dentro, e
que, como eu, não se preocupa em separar a escrita da vida. E, para ficar
apenas em três, Vladimir Nabokov, um autor dos detalhes, dos jogos de
luz e sombra, um pintor de palavras que não tinha medo de brincar com o
leitor”, elenca. Entre outros nomes, cita Clarice Lispector, Guimarães
Rosa, Conceição Evaristo, Raduan Nassar, Franz Kafka e
Vladimir Maiakovski.
Para a
escrita de “O Diálogo”, a autora acredita que as maiores influências
diretas foram de obras de filosofia, o existencialismo Sartreano e o erotismo
em Bataille. “Mas, olhando em retrospectiva, eu fiz questão de utilizar e
brincar com algumas obras e autores, como Hilda Hilst, Marguerite Duras,
Serguei Dovlatov, Franz Kafka, Lewis Carroll, Vladimir Nabokov. Eu adoro
brincar com referências”, frisa.
Confira
Luizza Milczanowski lendo um trecho do diálogo
Uma mulher sentada em seu apartamento vazio a olhar para dentro de si. Seu desejo é o desejo de muitas sobreviventes: romper o silêncio. “Quantas vezes nossas dores não são silenciadas? Quantas vezes nossas narrativas não são apagadas? "O Diálogo" é fim de silêncio longo. E eu te convido a ouvir”, propõe a escritora. Escute aqui:
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