por Leo Barth___
Fotografia: Leon Pauleikhoff |
Ao som dodecafônico de Arnold Schoenberg, o
cachorro Rubi, transmutado, hoje, em um maltês alegre, sibila: "Louvado
seja o fator polissêmico!"
O
texto de Wellington Amâncio, seja ele um conto, crônica ou fábula, afinal,
parafraseando o escritor Marcelino Freire, um texto é aquilo que o escritor diz
ser e ponto final, apropria-se corajosamente da fábula O sapo e o escorpião de
forma potente e perturbadora. Ora, a poesia que não incomoda e ou perturba é
tão somente um bibelô barato da forma arte pela arte, sendo plástica, frívola e
anêmica, ou seja, sem vigor de mocotó e cuscuz.
O
ambiente de Bedelém, no sertão, é acometido por fortes chuvas - o barro invade
Prefeitura e Câmara, pilares da cidade, e as casas. Aponto aqui a alusão
mitológica judaico-cristã da criação do homem através do barro, e em
consonância à escola simbolista, sua ênfase sinestésica das cores, destaco o
marrom, símbolo do conservadorismo, do que é velho, mórbido e, sobretudo,
ultrapassado. Destarte, o homem sofre/luta contra as estruturas do mundo, as
engrenagens sociais, e estranha-se/reconcilia-se/estranha-se perante a
Natureza, não menos brutal, nada teleológica.
O
sapo Alfredinho, uma representação da fé na humanidade, da evolução espiritual,
d'uma essência em constante movimento, fortemente para o sumo bem frente
subjetivismo/determinismo devastador no
e do meio geográfico coronelista,
logo, sanguessuga no escorpião Manarii. E, um dos pontos centrais deveras
complexos é o contraste entre os dois personagens fabulares: o homem essência e
existência existe pela soma de dados lançados ao acaso, num lance mallarmaico,
ou carrega em si fatores rígidos e imutáveis? Ora, parafraseando o filósofo
Clóvis de Barros, o vento venta, a maré mareia, o sapo sapeia, e, ao final, no
tabuleiro ou campina de Lamparina, as peças se movem ou são pré-estabelecidas?
O
dilema batráquio do deixo morrer essa
besta-fera? denota a dúvida mediante perigo. Os escorpiões são escorpiões
(frase de efeito tal qual os jacarés não
bebem leite), mas podemos, de fato, alterar ou favorecer mudanças às
bestas-feras hominídeas numa era anti-científica que nega a circunferência da
terra ou ataca vacinas? Sinceramente, a tarefa exige um supra-otimismo e,
particularmente, sou o grilo pessimista diante de cascavéis oportunistas.
Abraço
o eterno retorno nietzscheano no mundo tal qual ele é, horrível e perverso.
Esse universo sertanejo cíclico, digo, a cada quatro anos as mesmas promessas
de raposas velhas vendo tudo pegar fogo, ou melhor, repintar-se de barro, do
velho e ultrapassado, do marrom, a cor dos chapéus que cobrem as cabeleiras de
novos coronéis ou reis com peniquinhos cheios.
Pobre
Alfredinho, espetado pela pinça anal do escorpião: duas mortes. Seria a
sentença panteísta que Deus, em tudo, é a vítima e a ponta da lança que mata o
inocente? Sei lá. Nada novo debaixo do céu da democracia burguesa e o demiurgo
navalhado deve se divertir observando o novo jornal com bafo de cerveja Brahma.
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