Criar, escrever, não fixa limites | Renata Santana

por Taciana Oliveira__





A escritora e jornalista Renata Santana é a convidada da semana da coluna Falatório.  O seu livro de poemas “O amor na 5ª série aos 30” acaba de ser lançado pela Edições Macondo - Selo Cachalote. Na nossa conversa virtual a autora revela: Escrevi esse livro como uma criança que acredita na brincadeira. 


1 – Quando se inicia teu encontro com a escrita? Quando você se descobre escritora?

Talvez na infância, quando criava narrativa pra tudo: recortava papel chamequinho, grampeava em formato de livro, fazia as ilustrações, depois criava a história e deixava o livrinho artesanal à disposição da família e das visitas, junto a pilha de revistas da sala. Sempre gostei de criar e inventar histórias, me sentia poderosa. Não sei quando descobri, eu sempre dizia que era escritora. E também minha revisora e editora. Quando eu tinha 11 anos lembro que escrevi um “Manual do adolescente” todo rimado, mas quando fiz 12 e me tornei adolescente o rasguei, o manual não serviu nem pra mim. E segui escrevendo outras coisas.

 

2 – Como você apresentaria o teu trabalho mais recente tomando como partida a escolha do título “O amor na 5ª série aos 30”?

Brinco dizendo que todos os poemas desse livro poderiam ter saído da última folha de um caderno escolar, sabe aquela última folha do caderno onde rascunhamos, desenhamos, fazemos caricaturas, declarações de amor, anotamos uma ideia maluca? Dentro dos nossos cadernos escolares, cartesianos, divididos em suas ciências, sempre há uma folha que é “a hora do recreio”, feita para o deboche, rebelde, anárquica. Depois, quando viramos adultos, nos tornamos este caderno e somos nós os divididos em compromissos, responsabilidades, projetos, mas, também há os intervalos, a “hora do recreio dos adultos” e este livro é sobre isso e carrega esse deboche no conteúdo e na forma.

 

3 – Você transita nos gêneros conto e poesia e tem o jornalismo na sua formação profissional. Escrever te define?

Acho que é o contrário de definir, criar, escrever, não fixa limites e me faz ser muitas, aumentou minhas estradas, ampliou minha voz.

 

 4 – O que “O amor na 5ª série aos 30” representa pra você? Quais foram suas inspirações?

Escrevi esse livro como uma criança que acredita na brincadeira. A minha inspiração é meu olhar sobre o amor e as paixões - esse playground onde Eros é representado como uma criança de asas. Onde temos 30, mas também somos inseguros, obsessivos, perdidos, paranoicos, infantis. Por isso, como estou na casa dos 30, há no livro algumas referências da minha adolescência vivida entre o final dos anos 90 e início dos anos 2000 e a literatura que li ao longo desses anos: Raça Negra, Anne Sexton, brincadeiras de rua, Silvio Santos, Fido Dido, jogos de tabuleiro, entre outras menos ou mais implícitas estão no livro para desenhar esse apocalipse na Disney que é chegar aos 30, 40 anos e perceber que também temos 12, 15, 18.

 

5 – O teu livro de poemas “A Mulher do Tempo” foi o vencedor do VII Prêmio Hermilo Borba Filho de Literatura e será publicado pela Cepe ainda este ano.  De que forma funciona o teu processo criativo? Você já pensa na produção de um novo projeto?

Não tenho rotina para criar, algumas ideias chegam e preciso capturar e escrever elas. Tem um caderninho ao lado da cama, mas tenho usado mais o bloquinho de notas do celular e o Drive. Depois, com tempo, olho praquela ideia e vou escutá-la. Só quando já estou no processo de um livro é que entro numa rotina terrível de obsessão pela escrita, uma relação de prazer e morte. Meu projeto atual é a campanha de divulgação de “O amor na 5 série” e, em breve, de “A mulher do tempo”. Sigo escrevendo e reescrevendo poemas e contos, mas não há na minha cabeça o desenho de um livro novo ainda.

 

6 – Como você enxerga o boom de editoras independentes e a participação crescente de mulheres periféricas no cenário editorial brasileiro? Ainda há muito a se mudar/transformar?

Aqui em Pernambuco houve um movimento interessante. Algumas editoras independentes que no início dos anos 2000 surgiram como editoras de e-books, como a Castanha Mecânica, Vacatussa, Interpoética, como um Gutemberg às avessas, elas se voltaram para o analógico e se tornaram editoras de livros impressos, artesanais e com propostas ousadas que talvez não interessassem tanto ao mercado tradicional. Isso têm ajudado o autor independente a furar algumas bolhas e circular por aí. Antes do livro que sairá pele CEPE, eu publiquei meus textos em 5 editoras brasileiras independentes: Castanha Mecânica (PE), Vacatussa (PE), Urutau (SP), Primata (SP) e Macondo (MG). Mas ainda há muita coisa a transformar, sinto falta das políticas editoriais do Estado de PE incorporar mais as editoras independentes, seja na compra de livros, na parceria com as escolas e bibliotecas públicas, onde tenho certeza de que o processo de artesania do livro iria despertar o interesse dos jovens leitores.



SERVIÇO:

Livro “O amor na 5ª série aos 30”, de Renata Santana

Edições Macondo - Selo Cachalote

64 Páginas

R$ 36

Para comprar: clica aqui 


 



Renata Santana - Mulher, negra, nascida no Recife-PE e de origem periférica, é escritora, jornalista, bibliotecária, pesquisadora e mestre em Ciência da Informação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Publicou seu primeiro livro em 2019, “Na terceira margem do agora” (Ed. Castanha Mecânica). Publicou textos em antologias como “O poema se chama política” (2021), “Abrigo” (2020) e “Quem dera o sangue fosse só o da menstruação” (2019). Ainda em 2021, se tornou a primeira mulher negra recifense a ganhar o 7º Prêmio Hermilo Borba Filho de Literatura (antigo Prêmio Pernambuco de Literatura), na categoria poesia. A obra premiada, “A Mulher do Tempo”, será publicada pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) ainda neste primeiro semestre de 2022.

 




Taciana Oliveira – Editora das revistas Laudelinas e Mirada e do Selo Editorial Mirada. Cineasta e comunicóloga. I'm dancing barefoot heading for a spin. Some strange music draws me in…