por Taciana Oliveira__
Na coluna Falatório dessa
semana a escritora Carol Sanches nos apresenta o seu mais novo livro de poemas:
Tudo é química (Quintal Edições, 2022). A obra será lançada nos próximos
dias, mas já se encontra à venda no site da editora. Para comprar o seu exemplar:
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1 – Tudo é Química é apresentado como um projeto híbrido. Qual a gênese dos seus poemas e como nasce a concepção narrativa da obra?
Gosto
de pensar que somos seres híbridos, em transformação, e que as fronteiras que
nos diferenciam de outros seres são um tanto embaralhadas. Onde eu termino e o
outro começa? O que nasce dessa mistura? Se cada qual tece a existência à sua
maneira, só é possível tecê-la a partir do encontro com o outro. É na química deste
encontro que o germe da vida acontece. Quis trazer para a obra esse choque, o vir
a ser outros, a alquimia que se revela a vida.
2 – Como você se relaciona com a prática da
escrita no dia a dia? Você tem alguma rotina? É um processo intuitivo ou requer
alguma metodologia?
Não sou
processual. Meus processos de escrita são caóticos, acho que seguem o ritmo da
intuição. Mantenho por perto lápis e caneta, escrevo tudo o que me vem,
diariamente: ideias, reflexões, aprendizados, trechos de livros que estou lendo
e que me arrebataram. Se por acaso volto às anotações tempos depois, é sempre
uma surpresa compreender o processo que me trouxe até aqui. Daí não me aguento
e anoto por cima das anotações passadas. Há uma espécie de debate com a Carol
do passado. Diferentes canetas se misturam e as palavras tentam se articular
nos espaços que ainda sobram. Fico tentando preencher vazios. Por um momento, até
acho que consegui. Não demora muito até a névoa se dissipar e eu ver que os
vazios continuam lá. Nem franziram a testa.
3 –
Você acredita que a criação poética é uma reação à realidade que nos confronta?
Difícil
saber. Tenho feito aula de dança contemporânea e começamos a ensaiar, há pouco
tempo, um tango. Acho que a criação poética se assemelha muito ao tango. Você
não sabe quem está avançando e quem está recuando. A fagulha acontece, e você
pode chamar isso de reação; o corpo reage quando sente o estímulo, e mesmo o
passo para trás é também um passo para frente. A dança acontece em contrapesos.
A palavra é o meu contrapeso.
4 – Em Tudo
é Química percebe-se um diálogo entre diversas vozes, uma ressignificação
da memória, uma alquimia de sentimentos. Você escreve pensando em um projeto ou
trabalha a partir da seleção de textos já escritos?
A poesia,
em mim, acontece muito antes do projeto. Os poemas vão sendo escritos. É quase
como se abrisse, em mim, uma temporada de poemas. Tem quem ponha adubo,
fertilizante e, assim, dá poema o ano todo. No meu caso, dependo da boa vontade
das águas e da capacidade regenerativa da terra. Nunca sei qual é a época certa
de dar poemas. Sempre uma surpresa. Mas daí, um dia, olho para trás e percebo
que os poemas escritos fazem parte de uma determinada temporada. Possuem uma
narrativa própria. Começa, então, o exercício investigativo. Vou tentando descobrir
a gênese, converso com outros poetas, ofereço poemas para degustação, destrincho
mais, vejo o que sobra, se há sementes novas. Quero saber o que sentem, o que
pensam; o que sinto, o que penso do que sentem. Durante esse processo, muitas
vozes se misturam às minhas. É nessa fase que entra o projeto. Para dar forma
ao caos.
5 –
Como você concilia a maternidade, a leitura e a escrita?
Hoje, consigo conciliar melhor. Minhas filhas gostam de me ver lendo e escrevendo. Acham curioso me ver sublinhando os livros. Me perguntam o que estou anotando e se espantam com a quantidade de caderninhos espalhados pela casa. Sinto ambas mais fortes, e também mais felizes, quando me percebem amando o que faço. Mas essa reconciliação com outras partes minhas aconteceu só depois que elas cresceram um pouco mais. Levou muitos anos até conseguir reequilibrar minhas energias. Vejo que esse tempo de ausência na poesia foi o tempo necessário. Silenciosamente, o embrião de uma nova vida estava sendo gestado. Eu só não sabia.
Taciana Oliveira – Editora das revistas Laudelinas e Mirada e do Selo Editorial Mirada. Cineasta e comunicóloga. Na vitrolinha não cansa de ouvir os versos de Patti Smith: I'm dancing barefoot heading for a spin. Some strange music draws me in…