por Verônica Ramalho__
(Deos)
Coço a orelha com a língua.
Toda a massa meio mole, aflição
intensa.
(Deos)
Deriva a língua na ponta de cima, a ponta se empina, sinal insonoro.
O tempo empilha cada corte de unha, cada resto de resto, cada naco de pele, cada parte
de sobra, um grão.
Toda a terra o que sou. O caminho se espalha, camadas de cacas, sou todo chão. Provo o
relevo novo, subo morros mirantes escalo. Todo o relevo feito do que caiu de mim. O
nada se preenche de aparas.
(Antígona)
Trapos amontoado peles restos podres, acampamento desfeito cheiro humano. Rastros
frações amortizadas. Tecido papelão roídos, gordura, gosto conhecido. Saibo queima
carvão gravado.
Calha escorre água preta, linfa urbana escorre encontra grelha, deslizo,
sumidouro, ultrapasso. Língua queima, molhado aço. Evapora arrasto.
(Jardim)
Línguas erguidas arfam, tremem secas a agonia da espera. Brancas, amarelas, castanhas,
o jardim palpita ocre.
Há cortes bolhas bolotas, algumas camuflam herpes. Aftas se reproduzem, escorre pus pelo gramado.
Erguidas, as línguas arfam. Exibem sua decomposição.
(Jardim)
Lambidas pardas cortam a névoa, recendem cáseos. A flora muscular fede. Saburra é
escudo e espelho pro cheiro
forte, miasma intenso atordoa.
Lambidas desordenadas se esbarram,
alvoroço, indisposição e calor.
Corpos em leque, as plantas abanam. Aragem distribui e dispersa o azedo, sopro manso.
Assobio simula coro, aravia.