por Germana Accioly__
Saí do trabalho, com uma chuva moderada depois do meio-dia.
No elevador uma pessoa me sorri e diz, olhando para o adesivo redondo colado no meu peito:
O homem ta aí, né? Tô indo na Imbiribeira e depois sigo pra lá.
Sorri, comentei que vai estar cheio de gente e que tenho saudade dos comícios no Pátiodo Carmo.
Cheguei no térreo, me despedi e segui. Na Conde da Boa Vista uma senhora me parou e pediu o adesivo. Deixei no peito esquerdo dela e o caminho parecia mais aberto.
Cruzei
a Gervásio Pires e percebi o trânsito totalmente parado. Ainda achei que era a
chuva. Recife é fogo...
Na
altura da José de Alencar, os batedores travavam os sinais. As pessoas
apontavam para a Manoel Borba. Entregadores, ambulantes, passantes. O pessoal
dos sindicatos, das lojas, todo mundo nas ruas. Telefones com câmeras a postos.
Parei
na margem da calçada e alguém me disse: O homem vai passar aqui agora.
Por um
segundo quis ficar indiferente. Mas foi em vão.
Lembrei da posse em 2003, quando vi o Presidente passando em carro
aberto pela Esplanada dos Ministérios para tomar posse. Eu ali, testemunhando a
história. Que lembrança rica!
Fiquei
emocionada. A carapuça envernizada que me cobria desintegrou na hora.
Lula ia
passar novamente pelo meu caminho. Literalmente. Parei solenemente, tirei os
óculos escuros do rosto como quem tira um chapéu, faz uma reverência. Ou como
quem quer ver tudo ao vivo e em cores. Esperei, com o peito tamborilando, o
mesmo que guardava o adesivo há pouco tempo.
De
repente, todo mundo batia palmas, gritava e filmava. Vários carros passaram.
Polícia, sirene, velocidade. Talvez menos de um minuto e as motocicletas
liberaram os cruzamentos. Os carros voltaram a circular pelo Recife molhado.
Segui
meu caminho carregando na mochila uma coisa a mais e que, contraditoriamente,
estava mais leve.
Enchi o
peito de esperança.
Germana Accioly é escritora e jornalista. Publicou “Não é sobre você” (Selo Mirada, 2021). Escreve no blog Perder de Vista.