Quatro poemas de Wilma Amâncio da Silva

por Wilma Amâncio da Silva__


Kbelo/ @l.de.lula / @crias_do_kbelo


A política parece besteira


I-


Você que arrota poder,

sente orgulho ao humilhar 

seus semelhantes


Com o gozo produzido 

deleita-se, zomba e grita!

na batida repetida do chicote 

nas costas dos sertanejos


Para amedrontar

mostra força e hierarquia,

quer dilacerar seus pares, 

silenciar a voz da justiça


Fazer alguém baixar a cabeça 

e olhar para cima


Dança ao som de ronco estomacal

Delira no tilintar de pratos vazios


e antes de dormir, faz aquela bela 

oração de agradecimento por mais

um dia, com a sensação de dever cumprido




II-



Primeiro, é forçoso conviver 

com o silêncio da maldade 

e da indiferença platinada


E aguentar as pilhérias

que às vezes mal conversem 

ou escandalizam por dentro


Existem os interesses pessoais 

que sufocam os interesses coletivos


O poder se expressa em toda parte

Há vampiros feios se dando muito bem

Vende-se o sangue por dinheiro eleitoreiro


O cidadão comum é a imitação de um crápula

O cidadão comum se faz de boi-de-corte


Ah, o dinheiro é o rei sem calças

nessas terras secas, de viventes

de retinas revendidas


O egoísmo ultraja a bondade que resta

A ambição e a inveja são 

os velhos carros de faraó


Ah, pirâmides de dinheiro e o sufoco

dos nascidos em berço perdido

Onde estão os novos heróis?

Contando cédulas?




III-



Falácias vibram na boca do povo, 

as multidões almejam assistir 

alguém se lascar


E alguém se lasca 

ao manter sua postura,

ao levantar sua bandeira,

ao expressar suas convicções


Lei do silêncio, o coronel gosta de sangue


Da mente insana do prefeito 

o caos se instalou no município


E assim reina no lodo fedorento

esse novo deus sexagenário,

que não sabe escrever

e discursa alcoolizado 


Todo mundo toma após as suas facas,

espingardas, facões e palavras torpes


As famílias não se unificam, 

cada um corre 

para a mão que dá mais


Cargos estão acima da razão, 

o que importa agora é o status,

neste lugar onde os bairros

são divisados por velhos esgotos


Perdoo os que se vendem porque não

possuem nada, além da fome municipal


Não entendo os senhores de posses

que engordam muito 

feito as vacas de Basã




IV-



Vejo pessoas com garras cortantes nos dedos

Outros são invisíveis como a palma 

da mão de um defunto

Já uns brilham na brevidade 

de uma vela de sepulcro


Tudo isso é um tipozinho de morte

esperançosa que não quer morrer


Vê ali aquelas pessoas bajuladoras? 

Elas cantam felizes e dançam pisadeiro...

Nem toda a cerveja do mundo as bastaria!


Um cupinzeiro feliz, colorido, 

com tênis de marca, perfume importado

e roupa de grife que não sabe apreciar


Os maribondos chegaram 

dentro de Hilux e de Pajero

São vespas gordas 

em camisas manga longa azul bebê


Os anos eleitorais nos revelam 

as faces de muita gente —

máscaras coladas perpetuamente


Aquela pureza de espírito 

era um estratagema!

Tudo mentira, comer pastel de feira,

pegar na mão do povo,

depois lavar com álcool 70


O palanque emana energia ruim

Triste microfone engole

monotonias vocais...

E expectam ali, pacientemente,

todos os varrões do plano astral


Oh, tolo povo, o sorriso do maioral pode custar caro









Wilma Amâncio da Silva, natural de Delmiro Gouveia, interior das alagoas. É poeta, educadora da rede pública, pedagoga e mestra em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental. Desde a adolescência gosta de escrever poemas e contos. Publicou artigos científicos em revistas especializadas. Publicou o livro de poemas “As Alegorias” em 2020, pelas Edições Parresia. Participou de coletâneas e antologias nacionais de poemas, retratando diversos temas do imaginário sertanejo. Participou do projeto poético Enluaradas “Se essa lua fosse nossa”.  Contribuiu poeticamente à Ciranda de deusas e ao I Tomo das Bruxas “O ventre da vida”.