Dois poemas de Wendel Golfetto

 

por Wendel Golfetto__




 

Solitude de Poentes

 

A solitude de seu olhar

Transpassa alma turva

No crepúsculo vago

De passos brutos;

 

Desfigura o tempo

Em infinitos raios

A tomar espaços;

 

Resguarda as sombras

De memórias fanadas

Em derradeiros abraços.

 

Seu passar pela rua a

Deserta em galhos secos;

 

Dobra o sino

De medieval badalo;

 

Arregimenta céus

Em entoado desaguar;

 

Desmonta o segredo

Nos vergéis campos

Que lhe afogam;

 

Lateja

Assombro de poentes

Numa eloquente cadência

De parcial morte.

 

 

Estações de Trem Vazias

 

 

Se o paraíso é a beleza de uma praia

Ou a tranquilidade de um lago,

Então quero o inferno;

O furacão de um trago em segundos

No bar de uma passagem de galeria.

 

Não quero a natureza para o meu dia a dia,

Apenas para devaneios passageiros,

Pois me canso dessa reflexão em poesia.

 

Quero o embate no concreto armado;

O alvoroço dos bares ao meio-dia;

A música do trânsito na Marginal;

A britadeira rítmica rompendo o asfalto;

A sirene da ambulância na região central.

 

Nos bares, quero ouvir o espremedor de suco;

O estampido e repique da tampinha de garrafa

Para debaixo do balcão;

O encaixe dos copos na frenética lavada.

 

Quero ver o sol no colorido terraço

Rosa, azul e amarelo

De um Artacho.

 

Me sentar na quina do balcão;

Ver a luz solar invadindo os paredões dos edifícios;

Observar o movimento na entrada da Santa Casa;

Dividir digressões com personagens

De uma vida somente freada por um gole de cachaça.

 

Ver o nascer e morrer de lojas;

O velho ambulante aposentado do viaduto,

Que ninguém sabe onde mora

E que, na multidão, parece oculto.

 

Quero enxergar a paisagem de Hopper nos feriados;

O mistério da solidão no envelhecer na cidade;

Avistar a mim próprio

Na vida marcada nas esquinas

De um passado e presente que se encontram

Entre estações de trem vazias.

 



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Wendel Golfetto - Nascido na capital paulista e formado em Direito pela PUC/SP, com mestrado na mesma instituição, o autor é servidor público. Possui algumas publicações em zines, na revista digital Kuruma'tá e em três antologias que reúnem diversos autores. Começou a escrever poemas ainda nos anos 1990, mas deixou-os engavetados, tendo retomado esse ofício da alma há quatro anos. Em 2022 lançou, de forma independente, o livro “Sanatório da Mente, o peso das sombras” onde reúne alguns de seus poemas de aspectos mais sombrios. Instagram: @sanatoriodamente