O quê da história, crônica de Carlos Monteiro

 por Carlos Monteiro__





                                                                   
                                                                               




                                                                 
                                                                           
                                                         
O quê da história

"Veja, ilustre passageiro, / o belo tipo faceiro / que o senhor tem ao seu lado. // No entanto, acredite / Quase morreu de bronquite / Salvou-o o Rum Creosotado".

Histórias antigas povoam nossa mente, sem, necessariamente, tenhamo-las vivido plenamente.

A do Rum Creosotado é uma delas. Lembro-me vagamente deste reclame nos bondes cariocas que, povoaram meu dia a dia por muitos anos e ainda estão vivos em mim, pois, nascido e criado em Santa Teresa, esse meio de transporte que, marcou a história da cidade, ainda se faz presente. Outro cartaz que marcou minha infância foi da Emulsão Scot. Quem não lembra do famoso óleo de fígado de bacalhau. O anúncio, cujo conteúdo mostrava um pescador com um enorme peixe às costas, apregoava os benefícios do fortificante. E tome colheradas e mais colheradas daquele creme branco de gosto terrivelmente forte. São as tais lembranças afetivas que, no caso, são olfativas e mal gustativas.

“O bonde era divertido, fresquinho e com gente de todos os tipos. Mas peguei pouco, logo mudaram para o ônibus elétrico”, disse-me uma amiga querida.

Já em 1963, o governador Carlos Lacerda, comprou-os decretando, ali, sua extinção. Em dezembro de 1967 realizou sua derradeira viagem na linha Alto da Boa Vista. Em 1971 foi a vez ser sumariamente desativado, no mês de abril, o Trólebus. Foi promovido como substituto do bonde; não deu certo!

O bonde de Santa ficou para contar história. Conta-a até os dias atuais sob uma saraivada de críticas dos moradores do bucólico bairro carioca.

Histórias são vividas e vívidas em nossa memória. Não, necessariamente vivenciadas diretamente. Muitas das vezes são histórias conhecidas de outros Carnavais. Passadas de pai para filho. Nossos interlocutores põem-se a rir, perguntam-nos do quão detalhes são sabidos e como sabemo-los. Põem-se a rir. Isso está no quão vívida está e é nossa memória. Somos vividos? Somos experientes? Não importa, muitas vezes e melhor gastar palavras, muito melhor é fazer poemas com elas, não o do famoso Rum Creosotado, mas, um que fale de amor, que conte a história de um amor e, por que não, amor pelo Rio.

Idades são tempos em movimento; cronológica, física, mental, espiritual... idade não importa. A importância está na maneira e forma que conduzimos a história de nossa vida. Histórias podem ser da Carochinha ou tão velhas quanto a Sé de Braga. Podem ser afetivas ou imaginárias. São histórias, momentos inesquecíveis que se tornaram permanentes em nossas mentes. porandubas eternais.

Afinal, para bom entendedor, meia palavra basta. Basta? Há histórias em que pingo se torna letra, a letra que há em meu nome.

Ah, hoje em dia temos o VLT, mas aí é outra história.

Depois do amanhecer te conto!

Não vamos perder o bonde da história.





Carlos Monteiro
 é fotógrafo, cronista e publicitário desde 1975, tendo trabalhado em alguns dos principais veículos nacionais. Atualmente escreve ‘Fotocrônicas’, misto de ensaio fotográfico e crônicas do cotidiano e vem realizando resenhas fotográficas do efêmero das cidades. Atua como freelancer para diversos veículos nacionais. Tem três fotolivros retratando a Cidade Maravilhosa.