Contas um conto? , crônica de Carlos Monteiro

 por Carlos Monteiro__


Segunda parte

Essa história de “gato que mia não arranha”... vai que ele não conhece o aforismo. Essa agonia levou uns cinco ou seis minutos. O prédio não tinha vigia, era tarde para bater no apartamento da síndica, talvez chamar Buscas e Salvamentos dos Bombeiros fosse uma solução. Preferi descer e tomar uns chopes no boteco da esquina. Horas tantas, como sempre expressa meu querido Carlos Leonam, com sono, cansado e meio bêbado, supus duas soluções: a redundância de ‘encarar de frente’ o problema ou dormir no carro estacionado na garagem do prédio. Vai que era só uma alucinação de estresse. Vai que não tinha nada em casa.

Subi, abri a porta e lá estava o Frajola. Os chopes o transformaram-no. Agora era o Lion-O dos Thundercats. De alvinegro ficou azulado com os cabelos em fogo. Tomei a pouca coragem que ainda me restava e fui em direção à cozinha de onde vinha um saboroso aroma de carne assada. Ignorei o ‘Gato The Cat’, deveria ser uma alucinação, no caso, uma alucinagato. O chope do ‘bunda de fora’ não era lá muito confiável, as sardinhas mumificadas, as moelas ao molho juntamente com os ovos coloridos da vitrine... praticamente um ácido psicodélico. Vagarosamente me aproximei do espaço gourmet e, silenciosamente, acompanhado pelo Frajola-Lion-O dou de cara com a minha amiga de avental, travessa na mão e a pergunta-olho de qualquer entrevista: “Pô cara, tu demorou hein?! Tá trabalhando demais! Fiz um jantar para gente em comemoração à minha estada por cá”.

Ficou por seis meses. Fiquei amigo do Frajola que, na verdade se chamava ‘Gaveta’, vai saber o porquê. Preferia dormir aos meus pés do que com ela. Devia ser a preguiça insana que tinha. Imagina escalar aquela cama. Pular no colchão... ao rés do chão, era bem mais prático.

Zero hora no relógio. A vida tem dessas coisas...





*todas as fotografias são de autoria de Carlos Monteiro



Carlos Monteir
o
 é fotógrafo, cronista e publicitário desde 1975, tendo trabalhado em alguns dos principais veículos nacionais. Atualmente escreve ‘Fotocrônicas’, misto de ensaio fotográfico e crônicas do cotidiano e vem realizando resenhas fotográficas do efêmero das cidades. Atua como freelancer para diversos veículos nacionais. Tem três fotolivros retratando a Cidade Maravilhosa.