por Ana Helena Reis__
Trecho de Visita adiada
Uma das composições com que mais me identifiquei me alertou a respeito de tudo o que deixei inacabado, mal resolvido, o que deveria ter feito e ainda não fiz; portanto, lhe digo: preciso de um tempo a mais para que, quando você chegar, possa me encontrar pronta para esse encontro. Veja se me compreende:
Me falta ainda arriscar além, apreciar mais pores do sol, caminhar descalça na areia sem pressa, tomar chuva no rosto, ver minhas flores rebrotarem por mais uma estação. Andar distraída, diminuir o trabalho, não me importar com problemas pequenos.
Ainda tenho amores a viver, sem medo de chorar por eles, pois hoje sei que murcha lentamente quem evita uma paixão.
Preciso de tempo para aceitar as pessoas como elas são, complicar menos, chorar mais. Dizer aos meus filhos tudo aquilo que deixei para depois e gostaria de ter dito, abraçá-los mais, beijá-los até cansar.
Trecho de Quem conta um conto
— Meus senhores, conforme o que apurei com os moradores, o falecido é um homem e foi atirado da janela da cozinha do 8º andar do prédio em frente. A bem dizer, trata-se de um crime passional, pois o indivíduo acabara de descobrir a traição da esposa
com o dono do restaurante da rua de baixo. Houve luta, gritos de socorro foram ouvidos e ela esfaqueou o pobre com o facão aqui do dono da venda. Jogou o corpo pela janela para terminar o serviço e saiu fugida do prédio, naquela direção. Acredito que, antes da remoção do corpo, é melhor passar o caso à polícia, para que possam ir a seu encalço o quanto antes.
Polícia chamada. O plástico preto continuava ali, abrigando o corpo inerte. Começou o interrogatório, e Lupércio se adiantou para recontar o ocorrido. Ouviram atentamente a história e, parados diante daquele plástico preto, fizeram a pergunta que a ninguém ocorrera:
— Quem achou o corpo na calçada e colocou o plástico preto?
Trecho de Surprise!
E assim foi em frente, até que todas as sugestões foram descartadas. Pensou com suas teclas: “Alguma coisa está errada com os algoritmos desse site... Ou fui eu que errei na hora de descrever minha mulher ideal?”. Releu as informações incluídas, não viu nada de errado. Certamente, o conjunto da obra tinha alguma coisa dissonante. Seria um problema com seu próprio perfil? Por isso não atraía a mulher ideal?
Pensou, ponderou e decidiu tentar uma pequena alteração para ver se teria mais sucesso. Mas o que poderia mudar, já que, a princípio, tudo o que estava ali parecia essencial?
Pesquisadora do comportamento humano. Investigadora de si mesma. Escritora do cotidiano. Ilustradora de devaneios. É como se define Ana Helena Reis (@pinceldecronica), que, aos 73 anos, conta com uma carreira profissional consagrada: formada em administração de empresas pela EAESP/FGV e mestre pela FEA/USP, é empresária, já publicou diversos livros acadêmicos, papers e trabalhos de pesquisa. Também conta com uma extensa vida acadêmica, tendo sido professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) na Faculdade de Economia e Administração durante 15 anos. A partir de 2019, começou a se dedicar à escrita literária e à publicação de textos em prosa: contos, crônicas e resenhas, relacionados a fatos e situações do cotidiano. Participou de coletâneas e antologias pelas editoras Off-Flip, Metamorfose, Santa Sede, Persona e Sinete. “Conto ou não conto?” (Editora Paraquedas, 124 págs.) é seu livro de estreia.