Casar, verbo intransitivo, crônica de Marcela Elisa__

 por Marcela Elisa__


Foto de Jr Korpa na Unsplash
                                           
           Estou sentada embaixo de um mosqueteiro de quinta categoria. Você sabe o que é um mosqueteiro, certo? Então, o meu, dizia que era para cama de casal, os comentários redigidos abaixo consistiam em “perfeito” e “ótimo custo x benefício”. Agora, estou aqui, com um troço beirando minha cabeça e malemá dá para cobrir os pés. Mas tudo bem. Talvez minhas pernas amanheçam com menos bolotas vermelhas e pele descascando de coceira danada provocada por essa chuva de pernilongo. 

Eu não ia falar disso. Eu ia dizer sobre meu coração despedaçado por um bicho homi que não vale um tostão de meu dia baiano. Mas esse mosqueteiro está me tirando do prumo. Ele até ficou bonito, sabe. Meu quarto tem um lençol pink, um abajur azul — dois, aliás, um de cada lado —, uma bandeira escrita “um livro é um corpo” e duas janelas enormes. Do lado de fora é verde que só! E tem o barulho do mar ao fundo. Enfim, o mosqueteiro. Como eu dizia, ficou bonita a coisa toda, mas agora quero me sentar um pouco na cama, escrever um texto, dar uma aula de transitividade verbal e estou até imaginando como ficará minha imagem na câmera do Google Meet: queimada do sol e com um véu de noiva que, ao invés de ir para baixo, vai para cima. Perfeito. 

Tá vendo? Lembrei do bofe. Véu, cor branca, casar. Inclusive, acabei de descobrir que casar é um verbo intransitivo, ou seja, não precisa de complemento para transmitir uma mensagem que faça sentido. Você acredita? Não considerei nem um pouco irônico, mesmo que meu coração esteja dilacerado, acabado, detonado. Ele até que parecia um bom partido, tinha ginga e tudo, mas queria cortar minhas asas para que eu não voe muito longe. “Só pode ir até a esquina, gata” ou ainda “Se você for, eu vou também”. Não dá, né. Não há amor que suporte o sujeito macho que não suporta a própria vida. 

Vocês podem pensar que eu tenho o coração peludo, deve ter saturno em capricórnio, essa disgrama. Mas, não. Não tenho. Meu saturno é em libra, xuxu. Mais do que digno, disse minha astróloga. O que acontece com o caso do indivíduo homem citado acima, é que é difícil mesmo encarar uma mulher que avoa, arrudeia e volta em um barco de pescador com sua rede farta de ideias, de ventos, de peixes. E tem outras coisas...sempre tem, você sabe. Essa história de viver um amor ainda tem pano pra manga, ainda mais na manga das mulheres! Das mães, então, nem se fale! Viver um amor (desses do rala e rola — lê-se róla—), depois da maternidade, é um jogo de muitas peças. Muitas regras.  Não pode isso, não pode aquilo. Não pode dormir na mesma casa que o pai do filho, não pode levar o boy para a festa da família, não pode nada. E se pode, depois tem gente falando: “Cê viu, fulana já tá de namorado novo”, “Cê viu, fulana separou, mas eu vi os dois juntos tomando coca-cola na padaria”. É um inferno. 

Acho melhor voltarmos a falar do mosqueteiro curto e baixo, que vai deixar meus pés de fora e vai me fazer de noiva para todos os alunos — no modo on-line — de língua portuguesa que tenho essa semana. É pá cabá cá pessoa.




Me chamo Marcela Elisa e sou mãe do Francisco, além de escritora, professora na educação básica e pesquisadora da Linguística Aplicada. Atualmente, moro no sul da Bahia e me dedico a ensinar Língua Portuguesa para a comunidade de Taipu de Dentro, enquanto escrevo meu primeiro livro sobre as experiências de ensinar e aprender pelo Brasil afora.  No mais, gosto de tarot, de ir a shows e de suar na corrida.