A língua espanhola e a sua literatura como aliadas na educação brasileira

 por Adriano Espíndola Santos__



Obra de Jr Korpa na Unsplash
                                                                           
1. INTRODUÇÃO 

Há inúmeros e grandes desafios para a concretização da educação brasileira. É preciso, para isso, que haja métodos e práticas eficientes, que transponham as barreiras naturais do aprendizado.

No que concerne ao alcance do ensino, no campo da linguagem, compete não só o aperfeiçoamento da língua materna, como a aproximação pela afeição de uma língua estrangeira, sendo um benéfico exercício para a expansão do conhecimento, e dando azo para que o falante da nova língua seja albergado por um novo espectro: um novo mundo de possibilidades. 

Pensa-se que a língua espanhola, por sua raiz latina, é mais palatável aos ouvidos do falante nativo do português brasileiro. Há palavras que se assemelham lexicalmente, o que torna congruente o estudo da novel língua.

O presente trabalho tem por finalidade investigar, de maneira sucinta, o engajamento da língua espanhola e da sua literatura na cadeia de ensino brasileira, compreendendo a acessibilidade, e de que maneira se conforma e se harmoniza à necessidade crescente de cognição de uma nova língua num cenário cibernético e globalizado.

Impende conjeturar que o estabelecimento de diretrizes para o ensino da língua espanhola e de sua literatura seja uma realidade cogente, com o peso de sua relevância global, para que cumpra a sua função social, e mais, para que possibilite o direito inalienável à literatura, ao fim e ao cabo.  

2. DESENVOLVIMENTO  

Há um passo importante na educação brasileira, definida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei n.º 9.394/1996 –, colocada em prática pela Base Nacional Comum Curricular, que estabelece, dentre outras coisas, a primazia do ensino de línguas estrangeiras, e o faz para o aperfeiçoamento do ensino, pela importância do desenvolvimento da cognição.

Nesse sentido, encaixa-se a aprendizagem da língua espanhola, como aliada no processo da educação brasileira, pois que se concebe a referida língua ser conexa lexicalmente à língua portuguesa, concepção que se dá pela origem latina e pela proximidade geológica dos países que as originam – “O espanhol e o português são as únicas duas línguas de alcance mundial que têm uma proximidade linguística de 89% em seu vocabulário”

Deve-se, além do mais, relatar que a aproximação pode ocorrer pelo afeto, pela didática praticada pelo docente, que tem o papel de tornar o processo de ensino e aprendizagem prazeroso, coerente com o nível e a complexidade que tem de atender à idade do discente – se se tratar do ensino regular.

A relevância de se aprender uma nova língua, no caso vertente a espanhola, tem a ver, inclusive, com o crescente e intenso processo de globalização. A conexão entre os mundos se dá, hoje, com um clique, e é interessante que o aluno possa acessar, de onde estiver, conteúdos que digam respeito a outra realidade social, para que tenha condições de enriquecer seus conhecimentos, fomentando, assim, a cultura e a diversidade, que são intrínsecas ao ser humano.

Cumpre discorrer sobre a dignidade da pessoa humana e o direito fundamental, inalienável, à literatura. Pensando no universo da literatura, que comporta inúmeros aprendizados, numa perspectiva do desenvolvimento psicofísico do indivíduo, saliente-se que o conhecimento literário permite, também, o contato com a empatia e a alteridade, pois que se pode compreender, a partir daí, diversos recursos sociais de outras sociedades, através do contato com a nova língua, assim como permear sobre cenários nunca imaginados, o que confere um ganho intelectual sem precedentes. 

No que concerne à alteridade, de ser porque o outro é, como dispõe a bonita filosofia Ubuntu, espera-se que o indivíduo falante da língua espanhola possa compreender a realidade de povos de diversas nacionalidades, como argentina e colombiana, por exemplo, e, assim, comparar os enfrentamentos do dia a dia, como questões que envolvem o racismo, a xenofobia e a misoginia. Ou seja, por meio da literatura, pode-se construir uma ponte importante de conhecimento e de constituição igualitária, onde as pessoas podem se encontrar, perceberem-se como seres humanos, possuidores do ínsito direito à dignidade humana, princípio basilar de nossa Constituição Federal de 1988.

“A literatura estimula e alimenta nossa imaginação, que é a essência da nossa humanidade; nos provoca e possibilita o exercício da alteridade, pois nos coloca no lugar de outra pessoa (as personagens); contribui para o desenvolvimento do nosso repertório linguístico, aumentando nossa capacidade de comunicação com o mundo; e, ainda, nos propicia de uma outra maneira conhecer o desenvolvimento do mundo e os conhecimentos produzidos ao longo da história”. (FERNANDEZ, 2020, online).


Nesse seguimento, compete trazer à baila os ensinamentos, sempre presentes, do professor Antonio Candido, onde estima a importância do direito fundamental à literatura. Vejamos:

“[...] a literatura aparece claramente como manifestação universal de todos os homens em todos os tempos. Não há povo e não há homem que possa viver sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em contacto com alguma espécie de fabulação. Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de passar as vinte e quatro horas do dia sem alguns momentos de entrega ao universo fabulado. O sonho assegura durante o sono a presença indispensável deste universo, independente da nossa vontade.”. (CANDIDO, 2011, p. 176-177).


Note-se que, numa percepção global, a literatura abarca os mais sublimes objetivos para a constituição humana. Não se cogita, hoje, notadamente na educação básica, o alheamento às diferentes dimensões da linguagem, sabendo-se que a comunicação é instrumento essencial para a formação do indivíduo, para a sua educação. 

A literatura de língua hispânica é vasta e rica, compreendendo vinte e um países que falam, como língua oficial, o espanhol. E a obra mais aclamada, mais antiga, que, decerto, é o primeiro exemplo oficial da prosa literária, dando azo ao romance moderno, é o compilado de Dom Quixote de La Mancha (Don Quijote de la Mancha), de Miguel de Cervantes

Fonte inesgotável do saber, a referida obra tem sido objeto de profundos estudos no Brasil, e pode ser acessada em formatos resumidos ou adaptados à faixas etárias dos alunos. Para tal, deve ser ressignificada para atender às necessidades e às diferentes realidades, o que enseja o letramento literário.

3. CONCLUSÃO 

Em razão da alteridade e da empatia, que se inserem pela literatura, os alunos podem ter contato com a língua espanhola, para ampliarem seu conhecimento de mundo, notadamente quanto às questões sociais, tão íntimas e manifestas, que congregam os povos.

A língua espanhola converte-se numa rica oportunidade do contato com uma língua estrangeira, pois que guarda fundamentos de constituição muito semelhantes à língua portuguesa, seja pela origem latina, seja pela posição geográfica dos dois países que as fundaram. 

Assim sendo, compreendendo-se a literatura como um direito fundamental, é relevante que possa estar à mão de todos os brasileiros, para que tenham experiências suprassensoriais, para o encontro com o eu e a percepção de que sou porque o outro é, em sociedade, como na filosofia Ubuntu.

Quanto à obra Dom Quixote de La Mancha, de Cervantes, vê-se que é uma ferramenta para o contato com a língua espanhola, em formatos adaptados, e não só, também fomenta o letramento literário, benefício que se inscreve em várias dimensões humanos, para o desenvolvimento psicofísico. 



4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 1 abr. 2024.


BRASIL. Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 27 mar. 2024.


BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acesso em: 02 abr. 2024.


CANDIDO, Antonio. Vários Escritos: Direito à Literatura. 5. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2011. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3327587/mod_resource/content/1/Candido%20O%20Direito%20%C3%A0%20Literatura.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2024.  


CAVALCANTE, Kellison Lima Cavalcante. Fundamentos da filosofia Ubuntu: afroperspectivas e o humanismo africano. Revista Semiárido De Visu, Petrolina, v. 8, n. 2, p. 184-192, 2020.


FERNANDEZ, Cida. Literatura como direito humano. Revista Emília, 2020. Disponível em: <https://emilia.org.br/literatura-como-direito-humano/>. Acesso em: 28 mar. 2024.


LIMA, Ana Raquel de Sousa. Quixote nas aulas de língua espanhola - leituras invertidas: um relato de experiência. LínguaTec, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, Bento Gonçalves v. 5, n. 2, p. 351-365, nov.2020.


MONTEIRO, Letícia Ribeiro. LIVRO-OBJETO: uma jornada criativa de Dom Quixote no uso de gêneros discursivos em espanhol. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Criatividade e Inovação em Metodologias de Ensino Superior da Universidade Federal do Pará, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ensino. Área de Concentração: Metodologias de Ensino Aprendizagem. Linha de Pesquisa: Inovações Metodológicas no Ensino Superior – INOVAMES. Belém, 2021.


SANTOS, Adriano Barreto Espíndola. O direito humano à literatura no município de Fortaleza. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7151, 29 jan. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/101426. Acesso em: 3 abr. 2024.






Adriano Espíndola Santos é natural de Fortaleza, Ceará. Em 2018 lançou seu primeiro livro, o romance “Flor no caos”, pela Desconcertos Editora; em 2020 os livros de contos, “Contículos de dores refratárias” e “o ano em que tudo começou”, e em 2021 o romance “Em mim, a clausura e o motim”, estes pela Editora Penalux. Colabora mensalmente com as Revistas Mirada, Samizdat e Vício Velho. Tem textos publicados em revistas literárias nacionais e internacionais. É advogado civilista-humanista, desejoso de conseguir evoluir — sempre. Mestre em Direito. Especialista em Escrita Literária e em Revisão de Textos. Membro do Coletivo de Escritoras e Escritores Delirantes. É dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto. instagram:@adrianoespindolasantos | Facebook:adriano.espindola. email: adrianoespindolasantos@gmail.com