Ensaio para um tratado de cicismos | Crônica de Anthony Almeida

 por Anthony Almeida__



Foto de Jr Korpa na Unsplash


             — Mamãe, vem cá! Vamos fazer um ensaio para um tratado de cicismos?

— O que é isso?

— Ah, eu quero colecionar as palavras que você criou e as que também só ouvi sendo faladas por você… As palavras que são filhas de Cici.

— Hmmm...

— Aí eu vou te perguntando e você me diz o significado, tá bom?

— Tá bom.

— O que é esgulepar?

— É na roupa. Sabe uma roupa relaxada, que fica toda troncha, na gola, na manga? Fica um lado maior, outro menor, meio folgada. Essa roupa aí tá toda esgulepada.

— O que é apiongar?

— Ficar triste, assim, com a cara bicuda.

— E esquipar?

— É passear pulando, correndo, todo serelepe.

— Impar?

— É quando come demais, fica lotado, fica impando assim: "ahn, ahn".

— Fuviar?

— Pode ser cutucar, pinicar, passar a mão, fazer carinho, cafuné, depende.

— Espapassar?

— É quando alguma coisa cozinha demais, aí passa do ponto, fica toda espapassada. Tipo arroz ou macarrão, ou feijão que cozinhou demais e fica aquilo mole, todo espapassado.

— E espapassado de sono?

— Aí é a pessoa que tá lá dormindo, jogada, morta de cansada, só o projeto, o mulambinho.

— E o que é vangolar?

— É passear bem muito! 

— E a diferença de esquipar pra vangolar?

— Vangolar é conhecer lugar que não conhece ainda, descobrir novas coisas. Esquipar é só sair pulando.

— O que é redolerar?

— Ixe! É aquela pessoa que fica moendo, chega numa loja e não vai comprar nada, fica só assim: "Tem outra cor, não? Tô só dando uma olhadinha. Depois eu venho". E fica só nisso, bota a vitrine da loja abaixo, bagunça tudo e não compra nada. Aff!

— O que é mamanzar?

— É ficar demorando, dando maçada.

— E o que é dar maçada?

— Ficar demorando a fazer as coisas.

— E manzanzar? 

— É fazer bem devagarinho.

— E qual é a diferença de mamanzar pra manzanzar?

— É quase a mesma coisa...

— O que é fatisco?

— Um pedacinho pequenininho assim. Só um fatisquinho assim. Tipo um pedacinho de queijo ou de doce de goiaba bem fininho.

— O que é bizinguelinho?

— Bizinguelo é uma coisinha pequenininha, tipo um chaveirinho, um zíper uma coisa miudinha assim.

— E cachete?

— É um comprimido, um remédio.

— Murianha?

— Muriçoca com piranha. Pernilongo federal.

— E catarica?

— Ecaaaa! É a sujeira do nariz.

— E o que é caeba?

— Caeba é cachaça, bebida.

— O que é bostoque?

— É um sapato velho ou então um que quando a pessoa calça machuca o pé, dói, faz calo e incomoda que só a piula.

— E, pra terminar, o que é buzigo?

— Buzigo você já sabe o que é!

— Sei?

— Sabe, sim. É o fevereiro das pessoas.

— Hahaha!

— E buzigo de menino novo tá sempre sujo!


— Caruaru. Junho, 2024.



Anthony Almeida nasceu em 1989, em Caruaru/PE. É cronista, geógrafo, professor e editor-adjunto da RUBEM — Revista da Crônica. Atualmente desenvolve pesquisa de doutorado em Geografia Literária na UFPE, campus Recife, sobre o tema ‘Geograficidades do mundo vivido-escrito na crônica brasileira’. Escreve para a Revista Mirada. Saiba mais: https://linktr.ee/anthonypaalmeida