por Marcela Elisa__
Foto de alam kusuma na Unsplash |
Não é à toa que, modéstia parte, sou uma professora que os estudantes gostam de conviver. Talvez porque também goste de estar com eles na escola, na rua, numa casa de sapê e, desse jeito, entre pauta na lousa, slide na televisão, preenchimento da SED, há uma fresta que, muitas das vezes, caímos todos dentro dela: É a fresta da vida.
Quando falo vida, é a vida nossa de cada dia mesmo.
“Ai, professora, não vejo a hora de ir pra casa. Quero ir embora. Não vejo a hora de falar com meu namorado. Hoje a gente tem a mesma rotina, ele acorda, faz o curso técnico e depois vai pra casa, almoça e vai pra escola. E eu aqui na escola a manhã toda, professora. A gente só tem a hora do almoço pra falar. Ele mora em Florianópolis, sabe. A gente nunca se viu pessoalmente. Quero ir embora, professora.”
“Gosto muito das suas aulas de inglês, professora. Você fala de um jeito que parece verdade, me dá até vontade de dar aulas quando eu for adulta, mas todo mundo me desanima, dizem que não vale a pena essa vida de aguentar a gente. É verdade isso, professora?
“Estou precisando de ajuda, professora. Sabe, minha namorada ficou com um garoto no ano passado e agora que estamos namorando, ele resolveu falar mal dela pelo corredor. Tudo mentira sobre ela. O que eu faço? Gostaria de ajudar porque isso está fazendo mal para ela.”
“Truuuuco! Seis, ladrão!! Vai, pega o baralho, a professora está vindo.”
Dizem que ensinar alguma “matéria” não tem nenhuma relação com o cotidiano da escola, mas como concordar com isso? Quem não enxerga certa beleza nesse sol que entra pela janela e atravessa as cortinas azuis enquanto os estudantes me contam sobre a vida deles e aprendem, com isso, como usar o verbo nas flexões mais polidas ou quais são os countable and uncountable nouns, percebe?
Me chamo Marcela Elisa e sou mãe do Francisco, além de escritora, professora na educação básica e pesquisadora da Linguística Aplicada. Atualmente, moro no sul da Bahia e me dedico a ensinar Língua Portuguesa para a comunidade de Taipu de Dentro, enquanto escrevo meu primeiro livro sobre as experiências de ensinar e aprender pelo Brasil afora. No mais, gosto de tarot, de ir a shows e de suar na corrida.