por Ronaldo Fernandes__
Círculo de Oração (pág. 69)
Descia do teto um fio que segurava aquele tecido transparente e todo furadinho. O ar entrava e saía. O tecido permitia a respiração. Depois, a minha vó me falou que o nome do tecido era filó. O filó é um tipo de tecido que pode ser utilizado para diversas finalidades e é ideal para a confecção de mosquiteiros, pois a transparência e os furinhos permitem a passagem do ar, mas barra a entrada de insetos. Para dormir bem numa casa que tem muita muriçoca é preciso ter um mosquiteiro e um ventilador. Lá em casa a gente chamava mosquito de muriçoca. Eu lembro que tinha sempre muita muriçoca em nossa casa e o meu avô, para espantar as muriçocas, usava um repelente natural: bosta de vaca. Ela devia estar seca.
Meu avô, ao final da tarde, saía pelos campos e recolhia as bostas de vaca que haviam secado ao sol. Tínhamos um tacho específico para isso. Ele colocava os pedaços de bosta seca no tacho e colocava fogo, mas não muito alto, apenas para ir queimando as bostas aos poucos e gerar uma fumaça. A fumaça era o repelente natural que espantava as muriçocas, mas também a gente. Ele pegava o tacho e com a fumaça que resultava da queima da bosta da vaca ele ia defumando a casa. Fugiam as muriçocas e também todos nós, pois não conseguíamos respirar com aquele fumacê que se formava.
Amarelo Vivo (pág. 77 e 78 )
— Opa.
— Opa!
— Falo do Campo Belo.
— Eu estou em Moema.
— Perto.
— Sim.
— Foto?
— Retribuo.
Recebo uma foto.
— Curtiu?
— Sim.
— Kd a tua?
Envio uma foto.
— Tenho local.
Amarelo Morto (pág. 91)
— Oi?
— Opa.
— Tudo bem?
— Tudo e você?
— Sozinho em casa. No tédio.
— Eu tô em Moema e você?
— Próximo ao shopping Ibirapuera.
— Estamos bem pertinho. Tá mostrando 800 metros.
— Sim.
— Vou te mandar foto. Vê se curte...
Envio uma foto.
— Quem gosta de coroa é asilo!
— Você tá errado. Quem gosta de coroa é rei.
Ronaldo Fernandes (@ronfernadis) é bacharel em administração de empresas e pós-graduado em direção e atuação teatral, além de diretor de operações em uma empresa de tecnologia. Natural de Paudalho, cidade da Zona da Mata de Pernambuco, veio ainda adolescente para Santos (SP), onde aprofundou as suas pesquisas na área de dramaturgia. É fundador da Cia Trilha de Teatro e um dos componentes do Grupo Tescom de Teatro (coletivos da região da baixada santista). Atuando como dramaturgo, diretor e ator, participou de diversos espetáculos, entre eles, “Amâncio”, peça que inspirou o livro homônimo que o autor lança pela editora Paraquedas.