por Mirada__
No livro “As Luzes de Dois Cérebros Anárquicos”, publicado pela Paraquedas, a autora paulista explora as relações complexas entre mães e filhas, iluminando os desafios emocionais vividos por gerações de mulheres.
Ana Barros faz sua estreia na literatura com o romance “As luzes de dois cérebros anárquicos”, publicado pela editora Paraquedas e contemplado pelo Programa de Ação Cultural (ProAC/SP). A obra aborda de forma sensível e potente os processos emocionais do luto, os efeitos da depressão e do Alzheimer em mulheres, além de explorar as relações conflituosas entre mães e filhas. A narrativa centra-se em três gerações de uma mesma família, iniciando a partir da morte repentina de uma delas, levando as que ficaram a lidarem com sentimentos de remorso, medo e culpa.
Desenvolvida em duas linhas narrativas: uma em primeira pessoa, sob o olhar da jovem Angela, que reflete sobre os oito dias após a morte da mãe, e outra em terceira pessoa, que destaca episódios do passado, explicando as atitudes das personagens. Essa alternância entre perspectivas enriquece a narrativa, permitindo que o leitor compreenda as complexidades emocionais vividas por cada uma.
Ana Barros destaca o encontro entre avó e neta, que, em suas solidões, buscam compreender suas emoções. Ambas lidam com doenças que afetam suas mentes, proporcionando ao leitor uma visão intimista das experiências de cada personagem, refletindo sobre a dor da solidão e a luta interna contra as limitações impostas pelas doenças. A autora ilustra de maneira eloquente os desafios do contato social e a perda da identidade, criando um retrato emocional profundo.
Além disso, Ana Barros, especialista em Produção de Textos Literários, coordena oficinas de escrita criativa e promove a literatura de autoras brasileiras. Sua transição para a escrita começou em 2018, após participar de uma oficina que transformou sua percepção sobre criatividade. O processo de criação do romance levou quase seis anos, durante os quais Ana aprimorou o texto e reescreveu a obra após receber mentoria de Jarid Arraes.
O resultado é um romance coeso que aborda temas relevantes da contemporaneidade, refletindo sobre as mazelas da sociedade atual. Com diálogos fluidos e tramas interligadas, Ana Barros entrega ao público uma narrativa que não apenas conta uma história, mas também proporciona uma reflexão profunda sobre a vida, a dor e a resistência emocional das mulheres.
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Seleção de trechos do livro “As luzes de dois cérebros anárquicos”, de Ana Barros
Trecho das págs. 20 e 21
"Rezei. Rezei para que essa sensação de alívio saísse de mim. Rezei para sentir tristeza. Rezei pedindo perdão por pecar o peso que mamãe fazia em mim tinha se esvaído. Eu estava feliz por ela ter ido cedo. Feliz por ela não ter me deixado no encargo de cuidar dela, como ela dizia que eu deveria. Rezei pedindo perdão por esses pensamentos impuros Honrar pai e mãe é um dos mandamentos bíblicos. Naquele momento eu não tinha nem pai, nem mãe, e eu estava grata por isso? Também tinha sido um alívio quando meu pai sumiu e nunca mais voltou."
Trecho da pág. 50
“E eu estava ali olhando para o teto, pensando nos tîcs nunca dados e nas hastes que não se fundiam e nos vazios que não existiriam em um ventilador moderno, como aquele que eu comprei para o meu apartamento. O meu apartamento. Que era também do banco. Que eu teria que dividir com o Miguel em caso de divórcio, mesmo que nós nunca tenhamos sido casados e ele nunca tenha pagado as prestações, porque aquele empréstimo estava ligado ao meu salário e assim que ele caía na conta já era abatido pelo banco. E esse também tinha sido um tîc. Mamãe morreu sem nunca ter me visto entrar na igreja de branco. Ela morreu sabendo que a filha vivia em pecado, mas pelo menos o pecado era consumado com alguém de sua escolha. E eu nem gostava desse pecado.”
Trecho da pág. 188
“Eu tinha que engolir a angústia por mais um dia, sempre por mais um dia, apenas um dia, e mais um e mais um, até explodir em mil pedacinhos como aquela garrafa de Velho Barreiro. O buraco em mim fora cavado muito antes do meu nascimento e eu afundei nele sem a possibilidade de respirar o ar puro.”
Ana Barros (@anabarros.co) é escritora e professora de escrita criativa. É especialista em produção de textos literários formada pelo Instituto Vera Cruz. Coordenou e ministrou oficinas de escrita criativa e em 2021 iniciou o Clube do Livro Contemporâneas, projeto que visa estimular a leitura de livros escritos por mulheres brasileiras. “As luzes de dois cérebros anárquicos” é seu primeiro romance e foi contemplado pelo Proac em 2023.