por Rinaldo Segundo__
O meu sofrimento menor tinha também outra explicação. Embora concordasse com Helena sobre a traição, eu depositava baixa expectativa em nosso pai. Vivenciei aos seis anos um episódio desconhecido por ela. Acompanhava-o uma tarde, quando ele encontrou a outra na casa dela, cheio de chamego. Estranhei e me perguntava se a minha
mãe sabia, quando a intimidade se escrachou:
— Príncipe, tem cerveja e guaraná no freezer — disse a outra.
— Pego lá, princesa — falou ele.
Senti pela primeira vez o peso da masculinidade e calei medroso, apesar da raiva. A minha autodefesa psicológica foi o autoengano, ao conceber naturalidade naquela relação. Meu pai me recomendou boca fechada, argumentando que seria o nosso segredo. Helena, mais destemida, teria contado à mamãe.
A realidade amanheceu juntos príncipe e princesa um dia, como um rio nunca igual. Lá em casa, imperou a revolta, que, como tal, escalou o ressentimento.
— Não confio mais em homem algum — repetia a minha mãe.
— Nunca vou confiar — apoiava minha irmã, ainda mais radicalizada.
Escolhi emudecer como Brutus traindo (o pai) Júlio César. Ouvi calado, mas recebi diariamente uma sentença condenatória do tribunal da autoconsciência que julgava a minha criança de seis anos. Distanciado do dever de honestidade, senti-me como um irmão impostor de Helena e um filho farsante de minha mãe. A minha autopunição culpada queria fazer desaparecer a minha covardia.”