por Taciana Oliveira___
Perpetuando a Ilha de Jeju com Tangerinas (Mondru, 2025), de Enzo Fuji, é um romance sensível que explora os temas do luto, da identidade e dos laços familiares. Ambientado na Ilha de Jeju, na Coreia do Sul, o livro acompanha Hae-In, um jovem introspectivo que precisa enfrentar o suicídio de seu avô, um evento que desencadeia uma jornada de autodescoberta e confronto com o passado.
A prosa poética e evocativa do autor captura a beleza agridoce da ilha, transformando a paisagem em um reflexo das emoções do protagonista. O falecimento do avô não apenas marca uma perda significativa, mas também impulsiona Hae-In a lidar com a ausência materna e com as rígidas expectativas sociais que o cercam.
A narrativa se desenrola através de flashbacks e reflexões, desvendando, pouco a pouco, a complexa dinâmica entre Hae-In, seu pai e sua tia. Enzo Fuji tece habilmente elementos da cultura coreana, como os rituais funerários e a centralidade da família, enriquecendo a história com camadas de significado e autenticidade.
A simbologia desempenha um papel fundamental na construção do romance: as tangerinas representam a essência da ilha e a memória, enquanto um estojo de lápis de cor se torna um símbolo da criatividade e da esperança de Hae-In. O ritmo contemplativo da narrativa permite uma imersão profunda nas emoções dos personagens e nas sutilezas de suas relações.
No conjunto, Perpetuando a Ilha de Jeju com Tangerinas é uma leitura comovente e reflexiva, que ressoa especialmente com aqueles que já enfrentaram a dor da perda ou buscaram compreender sua própria identidade. A prosa lírica de Enzo Fuji e sua abordagem delicada desses temas fazem deste romance uma contribuição marcante à literatura contemporânea.
Trecho do livro
“Antes de começar a chover, o sol, confuso, já escorregava às costas das Haenyeo que nadavam no mar. Quatro ondas espaçadas puseram a ondular igualmente à época do nascimento da primeira pessoa coreana. O contraste das roupas das idosas com a coloração do céu era único, as luzes contradiziam-se, tudo escurecendo ainda mais, e não havia um sinal de paz, muito menos de esperança. Um prisma metálico cumpriu-se, vindo na água-garoa o cheiro de hidróxido de sódio que destacou o vulcão Sunrise Peak refletido no céu. Não entraria em erupção com a chuva. No fundo, bem já no fundo, o sol ia, como se amparasse as senhoras, determinadas em regressar. Pediram urgência em um sobressalto, avisaram entre si sobre a chuva, em um sinal que nunca tinham feito, mas que indicava algum perigo. Os gritos foram tão arrebatadores que baforadas carregaram de uma só vez os abalones, polvos, ouriços-do-mar dentro das redes artesanais e seguiram uma atrás da outra em uma fila organizada, depois de mergulharem dez metros de profundidade. Elas amainaram no barco com o capitão exigindo pressa, ele não berrava. A pressa consistia em ajudá-las a ingressar. Era um homem alto, uma cabeça castanha, os olhos quase estupidamente calmos.”
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ENZO FUJI é um escritor paulista que já se destacou na cena literária com seus livros de poesia e contos. “Perpetuando a Ilha de Jeju com Tangerinas” marca sua incursão no universo do romance, consolidando sua voz como um autor promissor e talentoso.
Taciana Oliveira — Natural de Recife (PE), Bacharel em Comunicação Social (Rádio e TV) com Pós-Graduação em Cinema e Linguagem Audiovisual. Roteirista, atua em direção e produção cinematográfica, criadora das revistas digitais Laudelinas e Mirada, e do Selo Editorial Mirada. Dirigiu o documentário “Clarice Lispector — A Descoberta do Mundo” Publicou Coisa Perdida (Mirada, 2023) livro de poemas.